TJSP: Alimentos
APELAÇÃO – DIVÓRCIO – ALIMENTOS – Fixação de alimentos para a ex-mulher pelo período de um ano – Pretensão de perenização da obrigação alimentar – Rejeição – Alimentante costureira contemplada com 50% dos bens amealhados no curso do matrimônio, dentre os quais máquinas de costura industriais – Ausência de prova de incapacidade laborativa – Idade (54 anos), período de afastamento do mercado de trabalho formal (28 anos) e crise econômica mundial que, contudo, autorizam a fixação do prazo de dois anos para possibilitar sua reestruturação econômica – PARTILHA – Não comprovada a propriedade e a posse com ânimo de dono sobre os veículos indicados pelo cônjuge varão – Bens não integrantes do acervo partilhável – Sentença reformada em parte para fixar a obrigação alimentar pelo período de dois anos e para excluir os veículos da partilha – DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
(TJ-SP – AC: 10003859820198260022 SP 1000385-98.2019.8.26.0022, Relator: Alexandre Coelho, Data de Julgamento: 16/10/2020, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/10/2020)
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(…) Com a chegada desta nova realidade aos tribunais, as decisões passaram a ser no sentido de que, com o divórcio ou dissolução da união estável, não deve haver obrigação alimentar entre ex-cônjuges, ao menos em regra.
RODRIGO DA CUNHA PEREIRA lembra que “o casamento não pode ser visto como uma ‘previdência social’, nem um estímulo ao ócio. Nas palavras de Paulo Lobo: ‘O direito aos alimentos não tutela os que voluntariamente optaram pela ociosidade’. Os alimentos ficaram restritos aos casos específicos de real necessidade, e esta obrigação é recíproca entre os cônjuges. A presunção somente se aplica em favor dos filhos menores e incapazes.”
Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2020.0000847881
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000385-98.2019.8.26.0022, da Comarca de Amparo, em que é apelante S. H. G. D. (JUSTIÇA GRATUITA), é apelado G. D..
ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores THEODURETO CAMARGO (Presidente sem voto), CLARA MARIA ARAÚJO XAVIER E SALLES ROSSI.
São Paulo, 16 de outubro de 2020.
ALEXANDRE COELHO
Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Apelação nº 1000385-98.2019.8.26.0022
Apelante: S. H. G. D.
Apelado: G. D.
VOTO nº 16176/lmi
APELAÇÃO DIVÓRCIO – ALIMENTOS Fixação de alimentos para a ex-mulher pelo período de um ano
Pretensão de perenização da obrigação alimentar Rejeição Alimentante costureira contemplada com 50% dos bens amealhados no curso do matrimônio, dentre os quais máquinas de costura industriais – Ausência de prova de incapacidade laborativa Idade (54 anos), período de afastamento do mercado de trabalho formal (28 anos) e crise econômica mundial que, contudo, autorizam a fixação do prazo de dois anos para possibilitar sua reestruturação econômica
PARTILHA Não comprovada a propriedade e a posse com ânimo de dono sobre os veículos indicados pelo cônjuge varão
Bens não integrantes do acervo partilhável Sentença reformada em parte para fixar a obrigação alimentar pelo período de dois anos e para excluir os veículos da partilha DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
Trata-se de apelação interposta pela autora contra a respeitável
sentença, cujo relatório ora se adota, que julgou procedente a ação para decretar o divórcio
entre as partes, partilhar os bens e fixar alimentos em favor da autora, no valor de 40% da renda
mensal líquido do réu advinda de seu trabalho junto a empresa CASP S/A, pelo prazo de um
ano.
A apelante pugna pela reforma da r. sentença a fim de que a
pensão seja fixada de forma vitalícia e para sejam excluídos da partilha o automóvel Gol e a
mobilete. Sustenta que sempre se dedicou às tarefas domésticas, necessitando dos alimentos
sem prazo certo devido à idade e a impossibilidade de reinserção no mercado de trabalho em
razão da crise econômica. Alega, ainda, que os veículos não podem ser objeto de divisão
porque não pertencem às partes.
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O apelado não apresentou contrarrazões.
Não houve oposição ao julgamento virtual.
É o relatório do essencial.
Atendidos os requisitos de admissibilidade, o recurso é recebido no duplo efeito, nos termos do artigo 1.012, caput, do C.P.C., e conhecido.
A r. sentença decretou o divórcio entre o casal e partilhou os bens, dentre os quais um automóvel Gol e um ciclomotor Mobilete. Fixou, ainda, alimentos em favor da ex-cônjuge varoa, no valor de 40% da renda mensal líquida do réu junto à empresa CASP S/A.
Insurge a autora, requerendo o pensionamento em caráter vitalício e a exclusão de referidos veículos da partilha.
Pois bem.
A concessão de alimentos em favor de ex-cônjuge, em razão de seu caráter excepcional, demanda a efetiva comprovação da alegada necessidade.
É entendimento dominante que, com a isonomia conjugal, em que marido e mulher têm os mesmos direitos e obrigações, e em razão da abertura do mercado para as mulheres, a nova realidade socioeconômica dos cônjuges os coloca em pé de igualdade com relação ao trabalho e ao sustento da família, ao contrário de algumas décadas atrás, em que normalmente apenas o homem trabalhava, enquanto a mulher cuidava dos filhos e dos afazeres domésticos.
Com a chegada desta nova realidade aos tribunais, as decisões passaram a ser no sentido de que, com o divórcio ou dissolução da união estável, não deve haver obrigação alimentar entre ex-cônjuges, ao menos em regra.
RODRIGO DA CUNHA PEREIRA lembra que “o casamento não pode ser visto como uma ‘previdência social’, nem um estímulo ao ócio. Nas palavras de Paulo Lobo: ‘O direito aos alimentos não tutela os que voluntariamente optaram pela ociosidade’. Os alimentos ficaram restritos aos casos específicos de real necessidade, e esta obrigação é recíproca entre os cônjuges. A presunção somente se aplica em favor dos filhos menores e incapazes.” 1
No caso concreto, as partes foram casadas por cerca de 28 anos e, atualmente, a cônjuge varoa possui 54 anos de idade , tendo ela se dedicado às tarefas do lar e aos cuidados com o marido e o filho, não exercendo atividade laborativa com vínculo empregatício, durante o casamento .
Não se desconhece a dificuldade de recolocação no mercado
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formal de trabalho ante a idade e o tempo de dedicação exclusiva à família.. Contudo, não há elementos suficientes a autorizar a excepcional regra da perenização da obrigação alimentar.
Isso porque sequer foi alegada qualquer impossibilidade física pra o exercício de atividade laboral, havendo indícios de que a autora tenha trabalho informalmente como costureira em algum período do matrimônio, como se observa da qualificação presente na escritura de compra e venda firmada em 19/12/2002 (fls. 27).
Some-se a isso que a apelante foi contemplada com a partilha de 50% dos bens do casal, dentre os quais máquinas de costura industriais , que são exatamente os instrumentos de trabalho relativos à sua profissão.
Deste modo, não há que se falar em fixação vitalícia.
Contudo, ante o longo período de afastamento do mercado formal de trabalho somada a idade avançada e a crise econômica decorrente da pandemia do COVID-19 que assola o mundo, será grande a dificuldade para que el se reestruture economicamente, motivo qual de rigor a fixação do período de dois anos e não um ano, como decidido pelo MM. Juízo sentenciante.
Quanto à partilha dos veículos arrolados pelo réu, não foi comprovado a titularidade ou a posse com ânimo de dono sobre tais bens pelo casal . E os documentos apresentados a fls. 163/164 e 168 demonstram que os bens pertencem a terceiros, motivo pelo qual de rigor é a exclusão de referidos bens da partilha.
Diante de todo o exposto, de rigor é a reforma da r. sentença a fim de que a obrigação alimentar seja fixada pelo período de dois anos e para que os veículos VW Gol e Monark 50 cilindradas sejam excluídos da partilha.
Inobstante o novo desfecho com o julgamento do presente recurso, mantém-se as verbas sucumbenciais tal como fixadas, uma vez que já observada a sucumbência mínima do pedido da autora.
Incabível, ainda, a fixação de honorários recursais, ante o provimento parcial do recurso, nos termos do artigo 86, § 11, do Código de Processo Civil.
Por fim, com o intuito de se evitar a necessidade de oposição de embargos declaratórios para o específico fim de prequestionamento, como forma de se viabilizar a interposição de recursos nas instâncias superiores, fica, desde logo, prequestionada toda a matéria apontada, seja ela constitucional ou infraconstitucional e até mesmo infralegal, na medida em que houve a análise e consequente decisão em relação a todas as questões controvertidas, ressaltando que há muito já se pacificou o entendimento de que não está o colegiado obrigado a apreciar individualmente cada um dos dispositivos legais suscitados pelas
Apelação Cível nº 1000385-98.2019.8.26.0022 -Voto nº 16176/lmi 4
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partes, competindo a estas, no mais, observar o disposto no artigo 1026, §2º do CPC.
Caso ainda assim sejam opostos embargos de declaração contra o acórdão, estes serão julgados virtualmente, a bem da eficiência, salvo se a parte embargante manifestar expressa oposição na própria petição de interposição.
Ante o exposto, pelo presente voto, DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, nos termos acima expostos.
ALEXANDRE COELHO
Relator
(assinatura eletrônica)