TJRN: Alimentos
(…) A esse respeito, escreve Rodrigo da Cunha Pereira (Divórcio: teoria e prática. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 166-167): Com o acesso da mulher ao mercado de trabalho e a igualização de direitos entre homens e mulheres consolidada na Constituição Federal de 1988 e, consequentemente, entre os cônjuges, a estipulação de pensão alimentícia entre eles é cada vez menos frequente e está vinculada exclusivamente, à necessidade de quem a pleiteia, não mais se presumindo a necessidade da esposa, como previsto na Lei n. 5.478/68. O casamento não pode ser visto como uma “previdência social”, nem um estímulo ao ócio.
ADV: TALITA DE OLIVEIRA REVOREDO (OAB 6785/RN) REP: Ministério Público Estadual – 53ª Promotoria Natal – Processo: 0800354-67.2015.8.20.5002 – ALIMENTOS – LEI ESPECIAL Nº 5.478/68 – Alimentos – AUTOR: M.D.S.S.D.S. – RÉU: A.F.D.S. -SENTENÇA Vistos…Trata-se de ação de alimentos ajuizada por MARIA DO SOCORRO DA SILVA, por meio de advogada, em face de ANTONIO FRANCISCO DOS SANTOS, ambos qualificados na primeira página da petição inicial de id 1567406.Narrou a requerente que foi casada com o requerido, que o casamento foi contraído em 22 de novembro de 1984 e desfeito através de divórcio em 7 de julho de 2010, embora a separação de fato do casal tenha ocorrido bem antes, por volta de 1990, que tiveram 4 (quatro) filhos, todos maiores e capazes, e que, com a separação, os filhos, que eram menores de idade, passaram a perceber pensão alimentícia, que era gerida pela requerente.Afirmou que nunca teve vínculo de emprego, pois sempre se dedicou a cuidar dos filhos, e que, na época do divórcio, já contava com 50 (cinquenta) anos de idade, sem nenhuma qualificação profissional, e com algumas limitações físicas decorrentes de problemas de saúde.Aduziu, também, que, em ação revisional, as pensões alimentícias foram mantidas apenas em benefício dos filhos Daniel Silva dos Santos e Diana Silva dos Santos, mesmo assim reduzidas para 13% (treze) por cento dos rendimentos do requerido, ocasião em que passou a requerente a contar com a ajuda da filha mais velha, Daniele Silva dos Santos, que estaria prestes a se casar pensão se casou de idade, que adquiriram durante a convivência 1 (um) imóvel residencial, local onde reside a requerida, através de financiamento obtido com a Caixa Econômica Federal, com parcelas ainda em aberto, e que o casal se separou de fato em meados de 2007, não havendo possibilidade alguma de retomada do relacionamento conjugal.Asseverou, ainda, que o requerido tem capacidade para prestar alimentos em seu favor, já que aufere, mensalmente, proventos de aposentadoria na ordem de R$ 3.711,03 (três mil setecentos e onze Reais e três centavos).Assim, após apresentar os fundamentos jurídicos de seu pleito, protestou, ao final, pela concessão da assistência judiciária, concessão de alimentos provisórios, citação da parte requerida, condenação do requerido a pagar alimentos equivalentes a 30% (trinta por cento) dos seus rendimentos, e pelo direito de provar o alegado por todos meios de prova admitidos em direito, juntando alguns documentos com a exordial.Pelo despacho inaugural, foi concedida a assistência judiciária, indeferido o pleito de alimentos provisórios e determinada a citação do requerido (id 1584058).O requerido foi citado pessoalmente, através da sua curadora (ver id 3528208, p. 4-5) e apresentou contestação através de advogada (ver petição de id 4043241), que foi anexada à carta precatória, dentro do prazo legal, antes de ser devolvida a este Juízo, o que fez com que, posteriormente, tivesse sido aceita como tempestiva, afastando a alegação de revelia formulada pela autora, conforme decisão de id 7095258.Em apertada síntese, o requerido, representado por sua curadora, refutou a pretensão formulada pela autora, alegando que contava com 59 (cinquenta e nove) anos de idade, era portador de doença mental crônica e irreversível, não possuía casa própria, residindo com sua curadora, e que, após descontado os valores devidos a título de alimentos, sobrava quantia insuficiente para o atendimento das despesas necessárias à própria subsistência, sem contar que a requerida havia renunciado à pensão alimentícia ao tempo do divórcio.Assim, depois de apresentar os fundamentos jurídicos de sua resistência, protestou pela improcedência da demanda.Em seguida, a requerente apresentou réplica à contestação através da petição de id 4273372, asseverando que o requerido não estava mais pagando nenhuma pensão alimentícia, tendo juntado aos autos contracheque antigo, agindo de má-fé, pois desde julho de 2015 se encerrou o pagamento das pensões alimentícias que remanesciam dos 2 (dois) filhos mais novos.Por meio do despacho de id 6359966, foi designada audiência de conciliação, instrução e julgamento.Na audiência realizada em 20 de julho de 2016, foram colhidos os depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pela parte requerente (ver id 6880126).A requerente apresentou alegações finais através da petição de id 6922439.Por fim, a ilustre representante do Ministério Público apresentou parecer no id 8775119, opinando pela improcedência da ação.É, o relatório. Seguem motivação e decisão.Como visto, compete decidir se a requerente, na qualidade de ex-cônjuge do requerido, faz jus ao recebimento de pensão alimentícia a ser suportada por este.Um dos fundamentos utilizados na resistência do requerido, o de que, na época do divórcio, renunciou a requerente aos alimentos, deve ser desde logo rechaçado como fato impeditivo do direito da autora, e isso porque, de acordo com a legislação em vigor, precisamente pelo disposto nos artigos 1.694, caput, e 1.707, do Código Civil, seria ao menos discutível a possibilidade de renúncia aos alimentos, e, assim, a “renúncia” feita ao tempo do divórcio não impediria peremptoriamente que alguém viesse a requerer e a obter do ex-cônjuge alimentos, quando necessário para garantia da própria subsistência.De todo modo, ao que interessa à resolução desta demanda, não seria possível absolutamente falar neste caso em renúncia aos alimentos, pois os documentos colacionados aos autos demonstram que a requerente foi citada por edital quando da ação de divórcio promovida pelo requerido (ver docs. de id 6922536, p. 6, 6922471, p. 3-5 e 7), não tendo sequer tomado ciência, à época, do pedido de divórcio.Contudo, mesmo assim, não parece que deva o requerido suportar a prestação de requerente mencionou na petição inicial, a separação de fato do casal ocorreu muito antes da decretação do divórcio. Realmente, informou a autora que se separou do requerido por volta de 1990, enquanto o documento de id 6922559, p. 2, demonstra que o divórcio foi decretado 20 (vinte) anos após.Conclui-se, assim, que, quando da dissolução da vida em comum, tinha a requerente 30 (trinta) anos de idade, pouco importando que o divórcio, no sentido formal, só tenha ocorrido 20 (vinte) anos depois. Teve, então, a requerente, todas as possibilidades para recomeçar a vida, quando da separação de fato, sem a dependência do seu ex-marido, não sendo correto afirmar, como fez na inicial, que ficou casada até os 50 (cinquenta) anos com o requerido, pois isso não corresponde à realidade.Já faz muito tempo que o direito brasileiro reconhece a igualdade entre os cônjuges, de maneira que não é possível generalizar que em todo casamento a mulher exerça uma figura subalterna ou de dependência, sendo impedida pelo marido de trabalhar ou de estudar, o que, eventualmente, poderia justificar o direito a alimentos após a ruptura do vínculo matrimonial.Contudo, não produziu a requerida nenhuma prova apta a demonstrar que ficou impossibilitada, seja pelo casamento, seja pela criação dos filhos que advieram do casamento, de laborar, e, assim, de garantir o próprio sustento.Nesse sentido, perceba-se que TEREZINHA MACEDO BRAGA, GIZETE BERNARDO COELHO e MARIA DA CONCEIÇÃO FERREIRA, testemunhas arroladas pela requerente, afirmaram que a autora trabalhou em “casa de família”, como diarista, fazendo faxina ou lavando roupa, até cerca de 2 (dois) anos antes da data da audiência de instrução e julgamento, isto é, até o ano de 2014, e que vinha sendo mantida, atualmente, pela filha mais velha, por estar agora sofrendo problemas de saúde.Não é possível presumir, então, do simples fato do casamento, a necessidade de perceber alimentos de excônjuge, ainda mais quando se está diante de um matrimônio que durou cerca de 6 (seis) anos, vindo só agora a requerente a pleitear alimentos, possivelmente porque se encerrou o dever paterno de contribuir com o sustento dos filhos comuns das partes, em razão da maioridade alcançada por estes.A esse respeito, escreve Rodrigo da Cunha Pereira (Divórcio: teoria e prática. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 166-167): Com o acesso da mulher ao mercado de trabalho e a igualização de direitos entre homens e mulheres consolidada na Constituição Federal de 1988 e, consequentemente, entre os cônjuges, a estipulação de pensão alimentícia entre eles é cada vez menos frequente e está vinculada exclusivamente, à necessidade de quem a pleiteia, não mais se presumindo a necessidade da esposa, como previsto na Lei n. 5.478/68. O casamento não pode ser visto como uma “previdência social”, nem um estímulo ao ócio. Nas palavras de Paulo Lôbo: “O direito aos alimentos não tutela os que voluntariamente optaram pela ociosidade”. Os alimentos ficaram restritos aos casos específicos de real necessidade, e esta obrigação é recíproca entre os cônjuges. A presunção somente se aplica em favor dos filhos menores e incapazes. Acresça-se que, em casos como este, que, uma vez desfeita a sociedade conjugal, para a qual não se cogita mais de imputação de culpa pelo fracasso do matrimônio, deve o excônjuge, em caso de necessidade, procurar ajuda, primeiramente, dos seus parentes consanguíneos, ascendentes ou descendentes, valendo frisar que a requerida tem 4 (quatro) filhos maiores de idade que podem, ao menos em tese, contribuir com seu sustento.Assim, a responsabilidade do ex-cônjuge, homem ou mulher, deve ser interpretada como subsidiária, cabendo à pessoa com dificuldades para prover o próprio sustento procurar, primeiramente, o socorro dos seus parentes de sangue, e, só na falta deles, demandar contra o ex-cônjuge. Nada mais justo, portanto, que os filhos da requerente, em caso de necessidade desta, sejam os primeiros responsáveis por seu amparo e sustento.Por fim, embora não seja o mais importante ou primordial, necessário levar em conta os problemas de saúde que acometem o requerido, que demonstrou ser pessoa interditada, de maneira que a retirada de parte de seus proventos de aposentadoria certamente pode comprometer aquilo que é necessário à sua própria manutenção.Logo, a presente ação deve ser julgada improcedente.Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, julgo improcedente a ação de alimentos proposta por MARIA DO SOCORRO DA SILVA, deixando, portanto, de condenar ANTONIO FRANCISCO DOS SANTOS a pagar alimentos à ex-cônjuge, extinguindo o feito com resolução do mérito, o que faço com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC.Condeno a requerente nas custas e em honorários advocatícios, estes no equivalente a 10% (dez por cento) sobre o valor dado à causa, nos termos do que dispõe o art. 85, caput e parágrafos, do CPC, ficando suspensa, no entanto, a exigibilidade dessas verbas, por ser a requerida beneficiária da assistência judiciária.Publique-se. Registre-se. Intimemse.Aguarde-se o trânsito em julgado.Após, arquive-se o processo, com baixa na distribuição e demais cautelas legais.Natal, 5 de março de 2017.Andreo Aleksandro Nobre MarquesJuiz de Direito (documento assinado digitalmente na forma da Lei nº 11.419/06)