TJMG: abolição da separação judicial pós EC n. 66/2010
(…) Com a sobrevinda da Emenda Constitucional n. 66/10, a conferir nova redação ao parágrafo 6º do art. 226 da Constituição, o instituto da separação foi abolido da ordem jurídica brasileira, passando o divórcio a figurar como única ação para dissolução do casamento.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – CONVERSÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL EM DIVÓRCIO – EMENDA CONSTITUCIONAL 66/10 – ABOLIÇÃO DO INSTITUTO DA SEPARAÇÃO – DIVÓRCIO DECRETADO – PARTILHA DE BEM – JAZIGO – CEMITÉRIO PARTICULAR – POSSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO EM PARTE.
– Com a sobrevinda da Emenda Constitucional n. 66/10, a conferir nova redação ao parágrafo 6º do art. 226 da Constituição, o instituto da separação foi abolido da ordem jurídica brasileira, passando o divórcio a figurar como única ação para dissolução do casamento.
– No caso dos autos, já identificado, com clareza, o patrimônio do casal, e havendo elementos suficientes à pronta resolução da partilha de somente um bem, não se justifica relegar a sua partilha.
– Jazigo adquirido na constância do casamento de cemitério particular deve ser incluído na partilha, e dividido igualmente entre as partes, por ser considerado bem particular.
– Recurso provido em parte.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0382.14.001648-8/001 – COMARCA DE LAVRAS – APELANTE(S): M.G.M.B. – APELADO(A)(S): R.U.N.P.
A C Ó R D Ã O
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em < DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO >.
DES. EDUARDO ANDRADE
RELATOR.
DES. EDUARDO ANDRADE (RELATOR)
V O T O
Cuidam os autos de “Ação de Conversão de Separação Judicial em Divórcio c/c Partilha de Bens” ajuizada por M. G. M. B. em face de R. U. N. P., objetivando a decretação do divórcio do casal, e a transferência do direito de uso de jazigo perpétuo exclusivamente para sua titularidade.
Adoto o relatório da sentença de origem, acrescentando-lhe que o ilustre Juiz a quo julgou procedente o pedido de conversão de separação em divórcio e improcedente o pedido relativo ao direito exclusivo ao uso do jazigo perpétuo situado no Cemitério Parque Bosque da Esperança, Belo Horizonte/MG. (f. 35/36)
Irresignada, a parte autora interpôs o presente recurso de apelação às fls. 38/40, aduzindo, em síntese, que o requerido não compareceu à audiência de tentativa de conciliação, nem apresentou contestação, e que a revelia nesse caso consubstancia-se em presunção de aceitação do réu quanto ao pedido de partilha. Pretende a requerente, portanto, seja julgado procedente o seu pedido de partilha do jazigo, com a conseqüente expedição de ofício ao Cemitério Parque Bosque da Esperança. Ao final, pugnou pelo provimento do recurso.
Tendo em vista ser o réu revel e desprovido de patrono nos autos, este deixou de ser intimado do ato processual e não apresentou resposta ao recurso de apelação.
Vieram-me os autos conclusos.
Em se tratando de ação de conversão de separação em divórcio, em que inexiste o interesse de menor ou incapaz, desnecessária a remessa dos autos à d. Procuradoria Geral de Justiça.
É o relatório.
Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.
Infere-se dos autos que M. G. M. B. ajuizou a presente ação em face de R. U. N. P. objetivando a conversão da separação em divórcio, bem como a transferência, exclusivamente em seu favor, do direito de uso do jazigo adquirido na constância da união do casal.
Antes de avançar ao exame da matéria impugnada no recurso destaco que, como bem observou o d. juiz de primeiro grau, com a sobrevinda da Emenda Constitucional n. 66/10, que conferiu nova redação ao parágrafo 6º do art. 226 da Constituição, aboliu-se o instituto da separação, passando o divórcio a figurar como única ação para dissolução do casamento.
Confira-se:
“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
(…)
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.”
É sabido que, pela lei civil, o divórcio pode ser concedido sem que haja prévia partilha de bens (art. 1.518).
Também não se desconhece que, com a nova ordem inaugurada pela Emenda Constitucional 66/10, existe para cada consorte um verdadeiro direito potestativo de dissolver o vínculo conjugal – como concordam os renomados doutrinadores CRISTIANO CHAVES DE FARIAS1 , MARIA BERENICE DIAS2 e PABLO STOLZE GAGLIANO3 -, isto é, independente e desvinculado de qualquer justificativa ou cumprimento de lapso temporal.
Nessa perspectiva, não mais se admite que “controvérsias outras sirvam de óbice ao reconhecimento da dissolução do vínculo matrimonial, impondo perda de tempo e de objetividade ao juiz no meio de discussões relacionadas, por exemplo, à fixação de alimentos ou à reparação de danos morais.” (CRISTIANO CHAVES DE FARIAS)
Assim, em determinados casos, faz-se necessário e desejável – reconhece-se – que o divórcio seja decretado de imediato, reservando-se para momento posterior a elucidação e julgamento dos pedidos acessórios – tais como partilha de bens, guarda de filhos, alimentos etc. -, a fim de que evitar que a controvérsia instaurada em torno dessas questões comprometa o escopo de facilitação da dissolução nupcial, preconizado pela Emenda 66/10.
Dito isso, ressalto que por meio do presente recurso, a parte se insurge contra o capítulo da sentença que julgou improcedente o pedido de partilha do patrimônio do casal, qual seja, o jazigo, por considerar que o mesmo não é mais requisito indispensável à decretação do divórcio.
Ocorre que, no caso sub examine, o bem cuja partilha é desejada pela Autora já se encontra identificado com clareza nos autos, sendo perfeitamente passível de ser solucionada, de pronto, com base nos elementos já constantes do feito.
Desta forma, não me parece desejável, nem mesmo adequada, data venia, a postergação da partilha para outra demanda, seja por questão de economia, seja em prestígio do escopo de pacificação social.
Afinal, como adverte MARIA BERENICE DIAS4, a tendência de relegar a identificação e partilha do patrimônio comum do casal para outro momento é altamente nociva, pois dá azo a sérias desavenças, em perpetuação do litígio, e ainda impõe às partes a propositura de nova demanda, “desdobramento por demais desgastante, oneroso e tormentoso”.
Dito isso, entendo de rigor, desde já, a resolução da partilha do bem, procedendo-se, assim, à completa prestação jurisdicional.
Nessa perspectiva, e à luz do que prevê o art. 515, §1º, do CPC, passo ao exame do apelo, já com a advertência de que a partilha ocorrerá, no âmbito deste tribunal ad quem, pela primeira vez, não sendo cabível cogitar, portanto, de reformatio in pejus, a depender do desfecho dado ao caso – à semelhança do que ocorre nos casos de aplicação do art. 515, §3º, do CPC.
Conforme se extrai dos autos, a autora e o réu casaram-se em 1987 sob o regime de comunhão parcial de bens, consoante faz prova certidão de casamento de f. 09 e, na constância da união adquiriram jazigo perpétuo no Cemitério Parque Bosque da Esperança.
Inicialmente, e apenas a título de elucidação e diferenciação, ressalto que o jazigo adquirido durante a união matrimonial das partes é bem particular, haja vista se encontrar em cemitério privado. Exatamente por isso, encontra-se afastada qualquer discussão quanto à impossibilidade de transferência de jazigo público, bem público de uso especial, vez que o instituto da posse não permite a sua alienação pelo mero possuidor.
Nessa toada, apesar de o serviço realizado pelo Parque Bosque da Esperança prestar-se ao amplo interesse público, o cemitério desenvolve sua atividade em imóvel de titularidade privada, afastando a incidência das regras de direito administrativo.
Logo, ainda que no Formulário de Inscrição (f. 10) para realizar a compra do jazigo a autora da presente causa não tenha sido relacionada como co-proprietária, necessário afirmar que este bem deve ser partilhado da mesma forma que os outros bens adquiridos durante o casamento, conforme prevê o Código Civil no seu artigo 1.660, “verbis”:
“Entram na comunhão:
I – Os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; (…)”
Pois bem.
De outra sorte, não se pode perder de vista que a revelia, no presente caso, não significa a renúncia, por parte do réu, das regras que regem a partilha dos bens adquiridos durante a união do casal. Da revelia, respeitando as normas do CPC vigente, entende-se apenas que os fatos alegados pela autora, que independam de provas a serem produzidas no processo, sejam reputados verdadeiros.
“Art. 319. Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.”
Sendo assim, entendo que a pretensão da autora de obter exclusivamente para si a propriedade do jazigo adquirido pelo casal durante o matrimônio, não pode prosperar, visto que não constitui a revelia a abdicação de direitos patrimoniais pelo réu revel, mas tão somente incontroverso que o bem identificado foi adquirido na constância do casamento.
Por todo o exposto, deve tal bem ser partilhado igualmente entre as partes, em que cada um terá direito à metade da propriedade do jazigo adquirido durante a união.
Com essas considerações, DOU PROVIMENTO PARCIAL ao recurso para determinar a partilha do jazigo equitativamente entre M. G. M. B. e R. U. N. P.
Diante da sucumbência mínima da parte autora, condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em R$300,00 (trezentos reais)
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DES. GERALDO AUGUSTO (REVISOR) – De acordo com o(a) Relator(a).
DESA. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE – De acordo com o(a) Relator(a).
SÚMULA: “DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO”
1 A nova ação de divórcio e o seu objeto cognitivo. Artigo disponível em: http://dasfamilias.com/2011/05/29/a-nova-acao-de-divorcio-e-o-seu-objeto-cognitivo/ , acesso em 21/08/12.
2 EC 66/10 – e agora?. Artigo disponível em: http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=653, acesso em 21/08/12.
3 O novo divórcio. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 43.
4 Manual de Direito das Famílias, 5 ed. São Paulo: RT, 2009, p. 300.
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