TJDF: Direito homoafetivo
(…) A união estável se caracteriza pela pública e contínua convivência de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituir família (Lei 9.278/96, art. 1o). Não obstante, a união homoafetiva deve ser reconhecida e qualificada como entidade familiar, com consequências jurídicas idênticas a da união estável heterosexual, conforme decisão do c. STF no julgamento conjunto da ADPF n. 132 e ADI n. 4277, em que conferido efeito vinculante e eficácia erga omnes. Reconhecida a união homoafetiva como entidade familiar, não há razão para não se conferir igual proteção legal à união estável entre heterossexuais. (…) TJ-DF – APC: 20100110526589 DF 0022361-90.2010.8.07.0001, Relator: JAIR SOARES, Data de Julgamento: 07/05/2014, 6ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 13/05/2014 . Pág.: 200)
Órgão 6ª Turma Cível
Processo N. Apelação Cível 20100110526589APC
Apelante(s) F. G. V. E OUTROS
Apelado(s) D. P. M.
Relator Desembargador JAIR SOARES
Revisor Desembargador JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA
Acórdão Nº 787.003
E M E N T A
Reconhecimento de união estável homoafetiva. Inovação do pedido. Consentimento do réu.
1 – Feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir sem o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei (CPC, art. 264).
2 – Reconhecida a união homoafetiva como entidade familiar pelo c. STF no julgamento da ADPF n. 132 e na ADI n. 4277, a que se conferiu efeito vinculante e eficácia erga omnes, há que se conferir proteção legal à união entre pessoas do mesmo sexo.
3 – Apelação não provida.
A C Ó R D Ã O
Acordam os Senhores Desembargadores da 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, JAIR SOARES – Relator, JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA – Revisor, VERA ANDRIGHI – Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador JAIR SOARES, em proferir a seguinte decisão: CONHECIDO. REJEITADAS AS PRELIMINARES. DESPROVIDO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 7 de maio de 2014
Documento Assinado Digitalmente
08/05/2014 – 15:01
Desembargador JAIR SOARES
Relator
R E L A T Ó R I O
D. P. M. ajuizou ação de reconhecimento e dissolução de união estável homoafetiva post mortem em desfavor de F. G. V. e outros.
A sentença julgou procedente a ação e declarou a existência e a dissolução da união estável havida entre D. P. M. e J. G. V., no período de 1999 a 6.02.10 (fls. 720/23).
Apelaram os réus (fls. 727/33).
Sustentam que a sentença acolheu pedido novo, feito sem consentimento dos réus, o que viola o art. 264 do CPC. E a união estável só é possível entre homem e mulher, nos termos do art. 226, § 3º da CF e do art. 1.723 do CC.
Preparo regular (f. 734). Contrarrazões apresentadas (fls. 740/43).
Parecer da d. Procuradoria de Justiça informando a não intervenção ministerial (fls. 749/50).
V O T O S
O Senhor Desembargador JAIR SOARES – Relator
Os réus alegam que o autor fez pedido novo nas alegações finais (f. 679) ao requerer que fossem reconhecidos direitos sucessórios. E a sentença julgou procedente o tal pedido, sem o consentimento dos réus quanto à inovação.
Feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei (CPC, art. 264).
O autor juntou documento (fls. 708/24) informando a existência de escritura pública de inventário e partilha do espólio de J. G. V..
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer a existência e a dissolução da união estável homoafetiva, e determinou (fls. 720/3):
“Oficie-se ao 1º Ofício de Notas, Registro Civil e Protesto, Registro de Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas, para que seja averbado às margens da Escritura Pública de Inventário e Partilha do Espólio de J. G. V. esta sentença, sem prejuízo do ajuizamento de ação própria pelo interessado para o resguardo de seus eventuais direitos sucessórios.”
Não houve reconhecimento de direitos sucessórios. A averbação da sentença às margens da escritura pública é providência de natureza administrativa. A determinação foi sem prejuízo de ajuizamento de ação própria pelo interessado para o resguardo de eventuais direitos sucessórios.
Não houve sentença extra ou ultra petita. A lide foi decidida nos limites em que proposta.
Rejeito a preliminar.
A união estável se caracteriza pela pública e contínua convivência de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituir família (Lei 9.278/96, art. 1o).
Não obstante, a união homoafetiva deve ser reconhecida e qualificada como entidade familiar, com consequências jurídicas idênticas a da união estável heterosexual, conforme decisão do c. STF no julgamento conjunto da ADPF n. 132 e ADI n. 4277, em que conferido efeito vinculante e eficácia erga omnes.
Reconhecida a união homoafetiva como entidade familiar, não há razão para não se conferir igual proteção legal à união estável entre heterossexuais.
Pertinente trecho do parecer do Ministério Público (fls. 695/705):
“A Constituição Federal, em seu art. 226, § 3º, reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, para efeito de proteção do estado, e preceitua o dever do legislador de facilitar a sua conversão em casamento.
Segue-se que a demanda social advinda das mudanças na dinâmica das relações afetivas encontrou na jurisprudência o reconhecimento das uniões homoafetivas como entidades familiares, à semelhança da união estável heterossexual. (…)”.
E precedente da Turma:
“AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. RELAÇÃO HOMOAFETIVA. VARA DE FAMÍLIA.
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar ADI 4277/DF e ADPF 132/RJ, esta ultima convertida em ADI, entendeu que o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, dá concretude aos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da liberdade, da proteção das minorias e da não-discriminação.
A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 226, §§ 3º e 4º, entende como entidade familiar aquela formada por homem e mulher, bem como aquela formada qualquer dos pais e seus descendentes. O referido artigo não pode sofrer uma interpretação restritiva, afastando a possibilidade de reconhecimento de entidade familiar entre pessoas do mesmo sexo, posto que não há norma que traga tal discriminação.
No novo contexto social, tendo em vista que o Poder Legislativo não tem acompanhado as modificações sociais, não pode o Poder Judiciário, sob a alegação de ausência de legislação, deixar de reconhecer como entidade familiar a relação entre pessoas do mesmo sexo.
A norma inserta no artigo 1723 do Código Civil não afasta a possibilidade de reconhecimento como entidade familiar entre pessoas do mesmo sexo, razão pela qual é competente a Vara de Família para julgar ação de reconhecimento e dissolução de união estável. Agravo conhecido e provido.” (Acórdão n.522013, 20110020026515AGI, Relator: Ana Maria Duarte Amarante Brito, 6ª Turma Cível, Data de Julgamento: 20/07/2011, Publicado no DJE: 28/07/2011. Pág.: 105).
Nego provimento.
O Senhor Desembargador JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA – Revisor
Com o Relator
A Senhora Desembargadora VERA ANDRIGHI – Vogal
Com o Relator.
D E C I S Ã O
CONHECIDO. REJEITADAS AS PRELIMINARES. DESPROVIDO. UNÂNIME.