TJAM: união estável
(…) Nesse diapasão, segundo ensinamento de Rodrigo da Cunha Pereira, em sua obra “Direito de Família e o Novo Código Civil”, Editora Del Rey, 2005, “o delineamento do conceito de união estável deve ser feito buscando os elementos caracterizadores de um “núcleo familiar”. É preciso saber se daquela relação nasceu uma entidade familiar; enquanto que os ingredientes da mesma são aqueles já demarcados principalmente pela jurisprudência e pela doutrina – pós Constituição de 1988: quais sejam a durabilidade, a estabilidade e, ainda, a relação de dependência econômica e/ou a moradia sob o mesmo teto. Entretanto, se faltar um desses elementos, não significa que esteja descaracterizada a união estável. Vale dizer, é o conjunto de determinados elementos o que ajuda o sentenciante a objetivar e a formatar o conceito de família; sendo que, o essencial é que se tenha formado com aquela relação afetiva e amorosa uma família, repita-se, propriamente dita e na acepção da Carta Federal. Os elementos intrínsecos e extrínsecos, objetivos e subjetivos, em cada caso concreto, são os que nos permitirão responder se na hipótese em apreço está caracterizada, ou não, a união estável.
Processo 060891860.2017.8.04.0001 – Procedimento Comum Cível – Seção Cível -REQUERENTE: S.M.D.R. – REQUERIDO: S. F.M.N. – Vistos, Trata-se de uma AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL COM PARTILHA DE BENS C/C PEDIDO DE ALIMENTOS, que foi proposta por dona S. M. D. R., em face do Sr. S. F. DE M. N., ambos devidamente qualificados e identificados desde o princípio. Acompanhando a inicial, vieram os documentos de fls. 11/162, 198/279 e 283/331. Assevera a parte autora que foi companheira do requerido por 15 (quinze) anos, isto é, entre 1998 até o início de 2013, quando se separaram; que dessa união não adveio filhos; que durante todo o período que viveram juntos ela sempre dependeu dele financeiramente; e que, após a separação, ficou estabelecido/ convencionado que o demandado pagaria, à título de alimentos, o valor mensal de R$ 10.000,00 (dez mil reais), o que perdurou de 2013 até setembro de 2016, momento em que isto foi interrompido. Em decorrência dos argumentos da vestibular e dos elementos de prova à ela anexados e, logicamente, a partir da respectiva citação;
a parte requerida apresentou a defesa de fls. 363/379, também com documentação, entre eles, o “INSTRUMENTO PARTICULAR DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL” de fls. 381/382, o qual resultou na Réplica e num Incidente de Falsidade, ao argumento de que “a autora não reconheceu a sua assinatura no documento”. Às fls. 495/526, o Perito Judicial juntou o Laudo Grafotécnico e os esclarecimentos de fls. 564/585, atestando a veracidade do dito documento; enquanto que os Peritos Assistentes juntaram seus respectivos Pareceres Técnicos às fls. 534/546 e 548/559. Então, às fls. 643/645, este Juízo julgou improcedente o incidente de falsidade. Foi designada audiência de saneamento às fls. 668/669; e, em seguida, foi pautada audiência de instrução e julgamento, ocasião em que foram tomados os depoimentos de ambas as partes (fls. 750/756). No caso concreto, evidencia-se desnecessária a intervenção do Ministério Público, uma vez que não estão sendo discutidos interesses de pessoa menor e/ou incapaz. EM SUMA, É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. 1. DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE Desde logo, deixo consignado que este juízo de direito resolveu e vai (de certa forma e por meio da presente decisão) antecipar o julgamento do mérito da demanda, mais exatamente, na forma permitida e disciplinada pelo artigo 355, inciso I, do Estatuto Processual Civil; o que faço haja vista que a (s) controvérsia (s) da lide foi (foram) suficientemente esclarecida (s) com a confrontação dos documentos que acompanham a vestibular e, também, a defesa; SEM QUE SEJA NECESSÁRIO ACRESCENTARMOS A SITUAÇÃO DECORRENTE DO SÉRIO PROBLEMA DA PANDEMIA DO CORONAVÍRUS, afetando o mundo inteiro, E A CONSEQUENTE PARALISAÇÃO DAS AUDIÊNCIAIS PRESENCIAIS NO ÂMBITO DO TJAM; porquanto, enfim, verifico desnecessária a dilação probatória. 2. DA UNIÃO ESTÁVEL PROPRIAMENTE DITA De início, ressalto que o artigo 226, § 3º da nossa Carta Magna dispõe que: “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”, norma constitucional que faço questão de destacar. Pois bem, em face do novo sistema constitucional, instituído pela CF de 1988 e alterações posteriores, que reconheceu a união estável como entidade familiar, assim entendida a convivência duradoura, pública e contínua entre um homem e uma mulher; ressalto que as famílias assim constituídas foram erigidas à condição de plena legitimidade, equiparando-se àquelas originadas do casamento civil, justamente, para efeito de proteção do Estado. Nesse diapasão, segundo ensinamento de Rodrigo da Cunha Pereira, em sua obra “Direito de Família e o Novo Código Civil”, Editora Del Rey, 2005, “o delineamento do conceito de união estável deve ser feito buscando os elementos caracterizadores de um “núcleo familiar”. É preciso saber se daquela relação nasceu uma entidade familiar; enquanto que os ingredientes da mesma são aqueles já demarcados principalmente pela jurisprudência e pela doutrina – pós Constituição de 1988: quais sejam a durabilidade, a estabilidade e, ainda, a relação de dependência econômica e/ou a moradia sob o mesmo teto. Entretanto, se faltar um desses elementos, não significa que esteja descaracterizada a união estável. Vale dizer, é o conjunto de determinados elementos o que ajuda o sentenciante a objetivar e a formatar o conceito de família; sendo que, o essencial é que se tenha formado com aquela relação afetiva e amorosa uma família, repita-se, propriamente dita e na acepção da Carta Federal. Os elementos intrínsecos e extrínsecos, objetivos e subjetivos, em cada caso concreto, são os que nos permitirão responder se na hipótese em apreço está caracterizada, ou não, a união estável. In casu, a autora pretende que seja declarada a existência de união estável havida por aproximadamente 14 (quatorze) anos entre ela e o requerido, ou seja entre abril de 1999 até janeiro de 2013, cumulada com partilha de bens e alimentos, conforme se extrai da vestibular e pelo seu depoimento de fls. 751/753. 3. DO PLEITO PRINCIPAL DE UNIÃO ESTÁVEL O PEDIDO PRINCIPAL, relativamente à união estável, PROCEDE EM PARTE, pois, analisando com a devida atenção a presente demanda, denota-se que o próprio réu comprovou/concordou, às fls. 381/382, que durante a relação que eles tiveram, as partes firmaram um INSTRUMENTO PARTICULAR DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL, onde declararam que viveram em União Estável desde 2002, sendo que o seu término ocorreu em janeiro de 2013; o que foi, na aludida ocasião, ratificado perante este juízo, quando o demandado disse – em seu depoimento que, “in verbis”: “… considera que o final da relação formalizada nesse contrato ocorreu em JANEIRO DE 2013.” (grifei e sublinhei). Ademais, depreendese ainda que os efeitos de um documento como este, lavrado pelas partes na data assinalada na lide, são por demais importantes e suficientes para que reste atestado o que no mesmo foi registrado. Afora que, sem dúvida, nenhuma mácula ao documento ou seu teor foi demonstrada, pelo que permanece hígido e válido, devendo os seus efeitos ter o alcance devido. Dessa maneira, a prova produzida nos autos permite concluirmos que os elementos caracterizadores da união estável tais como: o ânimo de constituir família, a continuidade, a comunhão de vida, a unicidade de vínculo, o affecto maritalis e a convivência more uxório, estiveram presentes na relação, na forma preconizada no artigo 226, § 3º, da Constituição Federal e no art. 1.723 do Código Civil; sem dúvida, POR UM TEMPO DE 11 (ONZE) ANOS, OU SEJA: DE 2002 ATÉ 2013; razão primordial para a procedência parcial de tal pretensão. Por outro lado, no que concerne ao período inicial e de término da relação suscitado na exordial, isto é, entre abril de 1999 e até o final de 2001, entendo, inclusive com amparo no depoimento da própria demandante, às fls. 751, que ESTE PERÍODO NÃO PASSOU DE UM NAMORO, ainda que com estreita intimidade, como atualmente acontece entre pessoas adultas, não havendo, contudo, maiores evidências de que se consistiu em união estável, ou melhor, numa efetiva vida em comum, com os requisitos que lhe são próprios, principalmente o do interesse mútuo da efetiva constituição de uma entidade familiar (àquela altura da relação e dos acontecimentos que desde então envolveram os litigantes, quais sejam dona S. M. D. R. e o Sr. S. F. DE M. N., ora suplicante e suplicado). 4. DA BUSCADA PARTILHA DE BENS Superada a controvérsia da união propriamente dita, no que diz respeito à pretensa partilha de bens, torna-se imperioso assinalar que o regime livremente convencionado pelos litigantes e que foi devidamente registrado no referido Pacto (fls. 381/382), notadamente, em suas Cláusulas Quinta, Sexta e Sétima, foi o da SEPARAÇÃO DE BENS. Em sendo assim, vislumbro a hipótese na qual, não se comunicam os bens presentes e futuros, de modo que aquilo que a cada um dos companheiros pertencer, assim permanecerá sem a ocorrência de comunicação com os bens do outro e/ou da outra. Ademais, ao meu sentir, não há qualquer motivo razoável para vedar que duas pessoas, em pleno gozo de sua capacidade civil, estipulem quanto aos seus bens o que lhes aprouver, como expressamente autoriza o artigo 1.639 em harmonia com o 1.725, ambos do CCB. Aliás, nesse ponto, permitome transcrever a mais recente jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, a qual pode ser perfeitamente aplicada nesta deliberação judicial, senão vejamos: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. LAVRATURA DE ESCRITURA PÚBLICA. ELEIÇÃO DO REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS. PARTILHA INVIABILIZADA. PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA. VÍCIO DE CONSENTIMENTO NÃO COMPROVADO. 1. Caso em que os conviventes, por ocasião da lavratura da escritura pública, elegeram, conforme lhes faculta o art. 1.725 do CC, o regime da separação de bens, conferindo expressamente efeitos retroativos ao início da relação. 4. Em observância ao princípio da autonomia privada e da ausência de comprovação da ocorrência de vício de consentimento, deve ser mantido o reconhecimento judicial acerca da inexistência de bens a partilhar. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível, Nº 70083730986, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em: 16-04-2020) (destaquei) Por conseguinte e sem maior delonga, ainda que alguma das partes tenha adquirido bens no período em questão, com eles devem permanecer, sem comunicação, por expressa disposição do pacto, RAZÃO PORQUE INDEFIRO O PEDIDO DE PARTILHA DE BENS. 5. DOS ALIMENTOS PARA A EX-COMPANHEIRA Por outro lado, quanto ao requerimento de alimentos e não obstante ao regime de bens da relação em apreço, mas considerando o reconhecido tempo de convivência entre as partes, quando a autora morou (ainda que não initerruptamente) e colaborou com o requerido e seus 04 (quatro) filhos, na organização da casa do Efigênio Sales e mesmo na vida cotidiana da família; juntamente com a circunstância de que a autora recebeu uma pensão extraoficial do demandado durante um certo tempo e até pelo fato de que a psicóloga S. M. D. R. trabalha num cargo comissionado do Egrégio Tribunal de Justiça do Amazonas e, portanto, de caráter provisório; e, por último, no sentido de que ela possa se preparar – de uma vez por todas – para a “nova” situação que se avizinha, isto é, quanto ao término efetivo de qualquer ligação entre ela e o demandado; e, assim, visando uma adequação para a ruptura definitiva dos dois e, em especial, amparado no BINÔMIO NECESSIDADE DE QUEM VOLTARÁ A RECEBER PENSÃO ALIMENTÍCIA DURANTE UM TEMPO BEM DEFINIDO E A NÍTIDA POSSIBILIDADE DO CIDADÃO QUE VAI FICAR RESPONSÁVEL POR ESSA OBRIGAÇÃO (aqui o empresário e representante comercial que figura como suplicado, qual seja o Sr. S. F. DE M. N.); DETERMINO/ESTABELEÇO O PAGAMENTO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA, ao encargo do requerido e em prol da requerente, NUMA QUANTIA EQUIVALENTE A 10 (DEZ) SALÁRIOS MÍNIMOS VIGENTES E MENSAIS (atuais R$ 10.450,00), a ser paga DURANTE UM PERÍODO – improrrogável -DE 03 (TRÊS) ANOS, tendo início no dia 07/07/2020 e término na data de 05/06/2023, ocasião em que o alimentante vai ficar automaticamente exonerado de tal tarefa. 6. FORMA DE PAGAMENTO DA PENSÃO Dessa maneira, como foi restabelecida por mais 03 (três) anos a obrigação do ex-companheiro S. F. DE M. N. de prestar alimentos à demandante, ESTABELEÇO AS SEGUINTES DIRETRIZES: (6.1.) A PENSÃO FIXADA (por esta sentença) TERÁ INÍCIO NO PRÓXIMO DIA 07 DE JULHO DE 2020 E O SEU TÉRMINO OCORRERÁ EM 05/06/2023, ou seja, SEMPRE NO 5º DIA ÚTIL DE CADA UM DESSES 36 (TRINTA E SEIS) MESES; (6.2.) A alimentada deve fornecer ou confirmar, em 05 (cinco) dias, a sua conta bancária para os aludidos depósitos mensais de 10 (dez) SALÁRIOS MÍNIMOS; (6.3.) Como visto, durante este período de 03 (três) anos, os alimentos acima tratados ficam atrelados ao aumento anual do salário mínimo, de acordo com o governo federal e, normalmente, no mês de janeiro de cada ano. (6.4.) Havendo um atraso comprovado e superior a 24 (vinte e quatro) horas, O ALIMENTANTE INCIDIRÁ EM MULTA DIÁRIA DE R$ 1.045,00 (um mil e quarenta e cinco reais) ATÉ O EFETIVO ADIMPLEMENTO MENSAL. (6.5.) Antes do primeiro pagamento, em 07 de julho do mês que vem, o requerido e alimentante provisório da autora, S. F. DE M. N., deve ser intimado para dizer se vai aguardar o transcurso dos 36 (trinta e seis) meses para o pagamento mensal da pensão em tela ou, caso queira se desvincular de vez do encargo alimentício que acaba de ser fixado, SUA PREFERÊNCIA DE FAZER O PAGAMENTO INTEGRAL DO MONTANTE DE R$ 376.200,00 (trezentos e setenta e seis mil e duzentos reais), nessa hipótese, igualmente, até o vindouro dia 07/07/2020. 7. DISPOSITIVO DA DECISÃO. Ante o exposto, nos termos do artigo 1.694, caput e parágrafo 1º, do Código Civil Brasileiro c/c o artigo 487, inciso I, do CPC/2015; (7.1.) ACOLHO PARCIALMENTE A PRETENSÃO AUTORAL; (7.2.) DECLARO QUE OS LITIGANTES CONVIVERAM EM UNIÃO ESTÁVEL no período do início de 2002 até janeiro de 2013, época de sua dissolução, com todos os efeitos e prerrogativas legais; (7.3.) CONDENO O REQUERIDO AO PAGAMENTO DOS ALIMENTOS ESTABELECIDOS E DESCRITOS NO TÓPICO ANTERIOR, no caso em benefício específico da Sra. S. M. D. R. e PELO CITADO PERÍODO DE 03 (TRÊS) ANOS (por intermédio de 36 pagamentos/ depósitos mensais de 10 SALÁRIOS MÍNIMOS) ou numa única parcela do total de R$ 376.200,00 (trezentos e setenta e seis mil e duzentos reais); (7.4.) REJEITO A PRETENSA PARTILHA DOS BENS ELENCADOS NA INICIAL; E, por derradeiro, (7.5.) JULGO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, devendo a Sra. Diretora de Secretaria diligenciar conforme seja necessário. 8. ÚLTIMAS CONSIDERAÇÕES Sem custas e sem honorários, em razão do dispositivo da decisão. P. R. I., via SAJ-PG5 e DJE/TJAM, e CUMPRA-SE, observadas as cautelas de estilo e com a urgência que a ação reclama. Transitando em julgado, PROCEDA-SE a baixa e o posterior arquivamento dos autos.