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Prefácios

Veja, abaixo, alguns dos prefácios que o Advogado Rodrigo da Cunha Pereira escreveu para grandes obras da área:

 

Direito Hereditário do Cônjuge e do Companheiro 

Prefácio (ou apresentação) Livro do Zeno Veloso – Ed. Saraiva

Rodrigo da Cunha Pereira
Uma das mais significativas mudanças do Código Civil de 2002 está no livro das Sucessões, mais especificamente na alteração da ordem da vocação hereditária, ao introduzir no ordenamento jurídico brasileiro o sistema da concorrência hereditária entre cônjuges e filhos, elevando o cônjuge à categoria de herdeiro necessário. Esta aparente, ingênua e simples alteração repercute e abala as bases do Direito Civil na medida em que dá novos destinos à propriedade, altera a concepção de família, desafia e balança o pêndulo da tão sonhada, mas difícil igualdade de direitos entre as diversas formas de família, enfim, relaciona-se à liberdade das pessoas de disporem livremente de seus bens após a sua morte.

Assim, com esta importante alteração o código Civil de 2002 trouxe e abriu uma série de dúvidas e questionamentos. Mas, a vida do Direito é mesmo assim, é na argumentação e contra argumentação que se faz a evolução, refina-se o pensamento jurídico, traz mais vida ao Direito e mais direitos à vida. E à morte, como é o caso do presente livro.

Este campo do Direito tem sido cheio de dúvidas e interpretações muito variadas. Todos os que trabalhamos com o Direito sentíamos falta da balizada opinião do jurista paraense, Zeno Veloso, sobre estas intrigantes e instigantes questões da sucessão post mordem do cônjuge e companheiro. Este livro vem preencher muitas lacunas. É que o pensamento e opinião do autor sobre este palpitante tema, não é uma simples opinião. É a palavra de autoridade, autorizada pela sua trajetória de vida. Zeno Veloso tem décadas e décadas de vida dedicada ao pensamento jurídico, ao compromisso com um Direito vivo e comprometido com a realidade social. O autor viveu e vive em Belém do Pará onde fez e criou família, trabalhou e trabalha ensinando Direito, escrevendo não apenas livros jurídicos, mas também em jornais de grande circulação. Vive para o Direito. A sua humanidade tornou-o tão popular que teve que se embrenhar pela política, tornando-se Deputado e depois Secretário de Justiça do Estado do Pará. Continua sua política, inclusive trabalhando como diretor da região norte do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Esta sua marca pessoal se desdobra e se traduz em solidariedade, bondade, simplicidade e sabedoria. Sua formação e conhecimento jurídico têm bases sólidas, abundantes. Mas, não é um mero técnico-jurídico. Seu raciocínio transcende e vai muito além da mera técnica jurídica, pois tem trazido para o mundo jurídico através de seus livros e palestras, todos os ingredientes que o Direito necessita para falar da vida como ela é, e com consistência.

Embora o autor seja uma autoridade, em vários outros campos do Direito, o seu realce maior tem sido no campo do Direito de Família e Sucessões. Sua experiência como tabelião, durante décadas, em cartório em Belém do Pará, permitiu-lhe associar a teoria á prática. Bem sabe Ele que uma teoria só tem sentido pelos resultados práticos que ela traz. É totalmente vazia e despida de sentido e razão lógica se ela não tiver aplicabilidade prática. E é exatamente isto que completa e enriquece a trajetória do autor e lhe dá autoridade para criar e fazer doutrina. É por isto que este livro já nasce como um livro referência e chave para ajudar a desvendar dúvidas sobre este tormentoso assunto da sucessão hereditária do cônjuge e companheiro. Com este livro o autor vem iluminar alguns obscuros caminhos apontados pela sucessão hereditária trazida pelo Código Civil de 2002. Mas, além de trazer respostas, nos traz também perguntas, que precisamos continuar nos perguntando. O verdadeiro jurista sabe que o Direito não tem uma única resposta e não pode fechar em si mesmo todas elas. A maturidade e consistência do autor faz dele a grande referência brasileira sobre o assunto. Zeno Veloso é também um andarilho do Direito. Já percorreu todo o Brasil levando oralmente, através de palestras, debates e conferências seu conhecimento e ensinamento O seu pensamento está espalhado para além dos limites territoriais brasileiros. Zeno Veloso é do mundo.

Livro “Separação, Divórcio e Inventário na Vida Administrativa”.
Autora: Maria Luiza Póvoa Cruz

PREFÁCIO

Rodrigo da Cunha Pereira
A Lei n. 11.441/07, além de facilitar o divórcio, a separação e o recebimento de herança, inova ao primar pela menor intervenção do Estado na vida privada do cidadão. Este é um sinal dos novos tempos em matéria de família e sucessões: a autonomia do privado.
Como toda lei nova, ou toda inovação, é natural que se criem resistências à sua aplicação ou aplicabilidade. Natural. O novo dá medo. É melhor ficar com o sapato velho. Mesmo velho. Mas, quem o diz bem é Caetano Veloso em sua música “Sampa”:
“E a mente apavora
O que ainda não é mesmo velho
(…)
E quem vem de outro sonho feliz de cidade
Aprende depressa a chamar-te de realidade”

Isto não significa que o velho é ruim. Não. Mas devemos deixar espaço para inovações. Renovação da vida. Esta lei facilita e possibilita agilidade, mais facilidade na desburocratização e ajuda a desafogar um pouco o Judiciário. É certo que não são esses simples processos os responsáveis pelo melancólico andamento dos processos judiciais, mas que esta lei ajudará um pouco, isto é verdade. Em grande parte dos tribunais brasileiros é comum um simples processo de inventário, sem menores, sem testamento e poucos bens, tramitar durante muitos meses. Difícil era fazer o jurisdicionado entender isto. Era explicar o inexplicável. Simples separações e divórcios, muitas vezes, demoravam também meses e meses para percorrer toda a burocracia da emperrada justiça.

Os resistentes ao “novo” têm dito que os inventários e separações/divórcios pela via administrativa serão uma porta aberta às fraudes. Engano. Fraudes e simulações sempre existiram e continuarão existindo. Isto faz parte da natureza humana. E é exatamente por isto que nasceu o Direito. Esta é a razão da lei jurídica e o “Direito só existe porque existe o torto” (Del Vecchio).

Resistências e reserva de mercado de trabalho à parte, a lei é boa. Incompleta, talvez, até porque completude não é do humano. Nós, profissionais e operadores do Direito, vivemos, sobrevivemos e argumentamos com as “brechas da lei”. É dessa incompletude, e em razão dela, que vamos criando jurisprudência e doutrina, construindo um Direito vivo, e mais, de acordo com a vida.

O livro de Maria Luiza Póvoa vem ajudar a completar a incompletude da lei. Em linguagem simples e objetiva, sem perder a profundidade e a seriedade, a autora percorre todo o texto da lei, acrescentando informações úteis e necessárias para uma boa e possível aplicação da Lei n. 11.441/07.

A autora foi muito cuidadosa ao transmitir essa prática da lei. Podemos dizer que este é um livro, um roteiro, sobre como praticar a lei, sobre seu funcionamento prático. Como se não bastasse, foi corajosa também ao fornecer “modelos de escritura”. Há quem acha que isto pode vulgarizar um livro, mas aqui não é o caso. Ao contrário, ela o valorizou em muito. Tornou-o ainda mais prático e adequado.

A autora goiana, magistrada e professora, empresta ao livro o conhecimento, a praticidade e um bom roteiro para iniciantes e iniciados colocarem em prática inventários, separações/divórcios pela via administrativa.

LIVRO: “As Intermitências da Vida – o nascimento dos não filhos à luz do Código Civil Brasileiro”

AUTOR: Luiz Edson Fachin

PREFÁCIO

“Pai” é uma questão para todos nós. Para os filhos que estão sempre buscando identificações e reconhecimentos; para as mães, que autorizam a existência e escolhem, consciente ou inconscientemente, o pai do seu filho, já que é o desejo da mãe que escolhe o pai; para os próprios pais em relação aos seus filhos e em relação aos seus pais. O pai, ou melhor, um pai, é mais que fundamental para a vida de um filho. Ele é fundante do sujeito. Ele dá o nome e encadeia a trama de significantes da vida de uma pessoa. O pai, morto ou vivo, ausente ou presente, determina não somente a cadeia de significantes da pessoa, mas também, com a mãe, transmite a cultura, a herança genética (quando o pai é também biológico) e uma série de outras influências, boas e más.

O pai nosso de cada dia, isto é, o nosso verdadeiro pai, não é necessariamente o nosso genitor. Na maioria das vezes coincide sê-lo, mas em muitas situações a relação biológica está desatrelada da paternidade. Por esta razão é que, hoje, no mundo jurídico, somos obrigados a distinguir e nomear as diferentes categorias de paternidade: registral, biológica, afetiva. Quando há coincidência entre essas três categorias de paternidade, não temos aí nenhum problema jurídico, especialmente quando é assim também pelo lado da mãe. A questão passa a ser de interesse jurídico quando essas três categorias se desatrelam. Ao Direito interessa intervir, trazendo um ideal de justiça, quando falta o entendimento entre as pessoas. Em outras palavras, faltou a lei interna em um dos sujeitos da relação, entra, então, a lei externa (jurídica) para atribuir direitos e responsabilidades.

A Constituição da República de 1988 consolidou e registrou a evolução histórica do Direito de Família. Ao proibir “quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação” (art. 227, § 6º), ela legitimou todos os filhos. Sim, porque alguns, além de discriminados, eram também “ilegitimados” pelo Estado. Tudo isto em nome de uma moral sexual civilizatória, como disse Freud. Foi essa moral que excluiu determinadas categorias de filhos, inclusive por meio de designações cujo significante, por si só, já os excluía: bastardos, adulterinos, ilegítimos, etc. Foram, durante muitos anos, excomungados, excluídos, rebaixados, inferiorizados, até que se deu um basta a esta moral hipócrita. Enquanto houver desejo sobre a face da terra continuarão nascendo filhos dentro e fora do casamento, pai que reconhece filho, ou não. O tortuoso caminho, ou descaminho, do desejo não pode ser interceptado totalmente pelo Direito para impedir que não exista o torto. O torto faz parte da vida, e esta é a razão da existência do Direito, já bem o disse o jusfilósofo italiano Georgio Del Vecchio. Enquanto isto, e independente da regulamentação jurídica e da lei, filhos continuarão nascendo.

A partir da compreensão de que a verdadeira paternidade é adotiva, isto é, se o pai não adotar o seu filho, mesmo o biológico, ele jamais será pai, o Direito começou a introduzir novas concepções para a regulamentação e distribuição de direitos e responsabilidades. Com isto, surge uma nova expressão jurídica: paternidade socioafetiva. Esta expressão é uma criação e inovação do Direito brasileiro. Ela começou a ser usada na década de 1980, após o importante texto do jurista mineiro João Baptista Villela, sob o título de “A desbiologização da paternidade”. Este texto foi publicado em 1979 na Revista n. 21 da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais e lançou as bases para a compreensão do que chamamos hoje de paternidade socioafetiva. Na década de 1980, Luiz Edson Fachin, em sua tese de doutorado, publicada depois (1996) sob o título “Da paternidade; relação biológica e afetiva”, consolida e instala de vez esta nova concepção de paternidade para além dos laços biológicos. Mas, o vínculo socioafetivo, gerador de efeitos jurídicos é mais amplo. Ele pode contemplar e resignificar também toda a parentalidade. É o que o autor escreveu, em conjunto com Carlos Eduardo Pianovski, na Revista Forense, volume 388: “Parentesco parabiológico. Fraternidade socioafetiva. Possibilidade jurídica. Efeitos que podem ensejar”.

O jurista gaúcho-paranaense, também conhecido como Professor Fachin, parece que traz em sua vida profissional o desafio de elucidar, corrigir injustiças e abater preconceitos sobre esta importante e, às vezes tormentosa, “questão do pai”. Talvez por ter sido um filho exemplar e um pai adotivo de suas duas filhas biológicas, cumprindo o exercício da função paterna como ato de amor e responsabilidade, como aliás deveriam ser todas as paternidades e maternidades. Mas não só por isto. É que o jurista Fachin parece ter sido predestinado a cumprir uma missão com responsabilidade social, por meio dos instrumentos do Direito. No âmago de sua extensa doutrina sobre o Direito Civil, a paternidade tem mesmo um lugar especial. Em 1992, ele publicou “Estabelecimento da filiação e paternidade presumida”; em 1995, em conjunto com outros autores, publicou “Averiguação e investigação da paternidade extramatrimonial – comentários à Lei nº. 8.560/92”; em 1996, “Da paternidade: relação biológica e afetiva”; em 1998, durante o I Congresso Brasileiro de Direito de Família, quando ele ajudava a fundar e a constituir o IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família, fez outro registro desta sua preocupação doutrinária “A nova filiação – crise e superação do Estabelecimento da Paternidade” (Anais do I Congresso, 1999). Não sei bem ao certo se é este tema que acompanha o jurista, ou se é o jurista quem o persegue. Fato é que este tema esteve e está presente em sua vida, e ele o traz para a cena jurídica do cotidiano das pessoas, com uma sensibilidade ímpar. Foi assim que, em outubro de 2003, durante o IV Congresso Brasileiro de Direito de Família em Belo Horizonte, emocionou centenas de pessoas com seu texto “A filha das estrelas em busca do artigo perdido” (publicado nos Anais do IV Congresso Brasileiro de Direito de Família); e, na evolução do seu pensamento, registrou, nos Anais do V Congresso Brasileiro de Direito de Família, “Palavras menores abandonadas”.

O pensamento de Fachin chegou a uma sofisticação e sutileza que saiu do “lugar-comum” para falar das questões da paternidade, que tanto nos perseguem e às vezes nos atormentam. Foi assim em “A filha das estrelas em busca do artigo perdido” e em “Palavras menores abandonadas”. Somente uma sensibilidade aguçadíssima para trazer à cena jurídica os asteriscos da certidão de nascimento de alguém que não teve um pai registral para traduzir um vazio existencial. O Direito tem que se haver com isto, tentar ajudar a encontrar uma resposta. Como preencher o vazio da vida? Como é possível uma simples certidão de nascimento traduzir tanto vazio e desamparo? Fachin consegue fazer disto uma poesia, tocar o coração e a razão das pessoas, e apontar uma direção, uma saída. Foi assim, também em “Palavras menores abandonadas”, que continuou apontando o caminho para os “filhos das estrelas”, e para o mundo jurídico, como única saída o amor, o afeto, palavras até então ignoradas e menosprezadas pelo mundo jurídico, palavras menores abandonadas.

Em “As intermitências da vida – o nascimento dos não filhos à luz do Código Civil Brasileiro”, o autor, mais uma vez, inova através de uma literatura jurídica muito própria e particular. Ele inaugura uma nova forma de “dizer o Direito”. Com seu estilo peculiar, semelhante ao estilo literário do autor português José Saramago, que, aliás, o inspirou, através de “Intermitências da morte”, a produzir o presente livro. Fachin apresenta-nos agora um pouco mais de sua alma de jurista. Mas, aviso desde já que não é um livro simples. Há uma brincadeira e um jogo de palavras que dão uma certa leveza ao texto, que, na verdade, amenizam a sua densidade. É também um texto poético. A poesia tem essa função de falar com delicadeza e leveza sobre as coisas mais profundas e mais sérias da vida, recebendo um toque de delicadeza. É assim este novo escrito de Fachin. Ele descreve uma tragédia fundamental do humano, que é não-ter-pai, ou deixar de ter um pai, deixar de ser filho… É possível isto? Daí o nome do livro “(…) dos não filhos (…)”. Somente a sensibilidade de Fachin para falar dessas coisas aparentemente impossíveis de serem ditas e trazidas para o mundo jurídico. É impossível não ser tocado por essas questões. É impossível não ser tocado pelo texto de Fachin.

O autor, além de trazer uma nova reflexão para o mundo jurídico sobre aspectos da constituição e desconstituição da paternidade, põe-nos a pensar sobre as novas formas de família que, na verdade, são variações em torno de um mesmo e velho tema: a estruturação do sujeito que se faz através de seus vínculos afetivos. Um pai e uma mãe são os elos fundamentais que engendram o sujeito humano. São tão fundamentais que a sua falta tem produzido os sintomas sociais alarmantes da nossa sociedade atual, tais como o aumento da criminalidade juvenil, balas perdidas, gravidez na adolescência, etc. São sinais da falta de pai. Pai tem, também, o sentido de limite e responsabilidade. É estruturador do sujeito. Retirar um pai da vida de um filho é tão ou mais grave que nunca tê-lo tido. Enfim, o que Fachin nos traz neste seu novo trabalho, que homenageia os 10 anos da criação do IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família, na verdade uma década de novos paradigmas, é a velha e constante questão de todos nós, o nosso desamparo estrutural, que se revela e se escancara claramente por meio dos “não-filhos” como muito bem disse o autor. A salvação é que o próprio autor, de uma certa forma, e heroicamente, assume a paternidade desses desarranjos da vida, e nos dá um pouco de amparo ao trazer essa luz para o mundo jurídico.

Livro: Direito Constitucional da Família
Autor: Lourival Serejo

PREFÁCIO À TERCEIRA EDIÇÃO

As mudanças provocadas no Direito de Família pela Constituição de 1988, foram tão profundas, que se pode dizer seguramente que há hoje um Direito Constitucional da Família. Houve uma verdadeira revolução, que se deu a partir de três eixos básicos: igualdade de direitos entre homens e mulheres e isonomia conjugal; alterou o sistema de filiação, legitimando todos os filhos, havidos dentro ou fora do casamento; e reconheceu todas as representações sociais da família dando legitimidade a todas elas. Como “Carta política” de um país, o seu conteúdo é muito mais que um conjunto de regras jurídicas. Ela estabelece os princípios norteadores do ordenamento jurídico. E os princípios, como bem já demarcou Norberto Bobbio, são normas generalíssimas do sistema e contêm o espírito que paira sobre todas as leis.

Mesmo com o Código civil, que entrou em vigor em janeiro 2003, muitos princípios constitucionais continuaram não contemplados pelas regras deste “novo” diploma legal. Daí a importância de se pensar, escrever e estruturar um Direito de Família Constitucional.

Sabemos que está em franca decadência nos ordenamentos jurídicos contemporâneos a concepção de Direito como estrutura formal, e conjunto de regras em cujo ponto de partida era um sujeito abstrato e sua importância centrada muito mais nas relações patrimoniais do que propriamente na valorização do sujeito em si. O Direito hoje, gira em torno do sujeito e sua valorização como pessoa humana real e das situações jurídicas, tendo em vista o processo de constitucionalização do Direito Civil. Em outras palavras, interessa na relação jurídica, muito mais o sujeito do que o seu objeto. E foi assim que mudaram os parâmetros hermenêuticos que norteiam o interprete. Com isto, o positivismo tornou-se insuficiente. As regras (leis) não conseguem acompanhar a evolução da realidade da vida, que precisa de uma regulamentação jurídica para dar proteção a determinadas situações. É assim que os princípios constitucionais ganharam força e reforço, afinal, assim como as regras (leis), eles são normas jurídicas.

O desembargador maranhense, ex-presidente do IBDFAM-MA, saiu na frente. Foi ele pioneiro em organizar essa idéia, transformando-a em livro, que materializa e traduz o novo espírito do Direito de Família. Sim, as leis têm um espírito, como já disse Montesquieu, em seu celebre tratado de 1747 “O Espírito das Leis”. E é neste sentido que Lourival Serejo, um talentoso “escrivinhador”, traduz e encarna a boa hermenêutica constitucional para o Direito de Família.

Prefácio

A possibilidade jurídica da pluriparentalidade é um dos temas mais atuais e palpitantes do Direito de Família contemporâneo. Ele vem ajudar a fazer o desdobramento e um melhor entendimento sobre a paternidade socioafetiva. Em outras palavras, desbiologizar a paternidade, estender esta ideia para o âmbito geral da parentalidade e instalar no Direito de Família todas as possibilidades dos vínculos familiares. Afinal, este é o espírito da constituição de 1988 ao legitimar todas as formas de famílias, todas as formas de filiação. E as leis têm o seu espírito, já dizia Montensquieu no século XVIII, em seu celebre tratado L’ Espirit des lois – É, portanto, neste espírito, e com este espírito que Aline Barradas Carneiro escreveu este trabalho.

Trazer para o mundo jurídico a possibilidade de adequação, legitimação e reconhecimento de outras formas de paternidade é uma árdua e imprescindível tarefa dos operadores do Direito. Significa, em outras palavras, trazer para o laço social e jurídico, aspectos mais importantes de nossas vidas. A questão do pai (e da mãe) são mais que fundamentais: são fundantes da nossa estruturação psíquica e, portanto de nossa constituição como sujeitos. Mas, é preciso entender que para nossa constituição de sujeitos e construção de nossa personalidade não é necessário “o” pai / mãe, mas sim “um” pai / mãe. Para que o ordenamento jurídico brasileiro recepcione a pluriparentalidade, como defende a autora, devemos desbiogizar a paternidade. Já se sabe hoje, com a ajuda de outros campos do conhecimento, que a paternidade e maternidade são funções exercidas. Por isto a possibilidade e a necessidade de se entender juridicamente os novos laços familiares, as novas entidades familiares, que são regidas principalmente pelo mais novo valor jurídico: o afeto. De valor jurídico à categoria de principio jurídico norteador do Direito de Família foi um passo. E é com base neste principio jurídico, principalmente, que se pode dizer hoje que a família não passa necessariamente, e em primeiro lugar, pelos vínculos biológicos.

A origem genética continua sendo importante e tendo seu lugar na atribuição e distribuição de direitos e deveres. Entretanto, não é mais fator único e exclusivo para a determinação de obrigações, ou mesmo fonte de responsabilidade civil. Muitas vezes a origem genética é apenas um elemento histórico na vida do sujeito. O mais importante, determinante e o responsável pela formação do sujeito e de sua personalidade é aquele quem ajudou, influenciou, enfim, quem exerceu as funções de pai e de mãe. É isto que realmente interessa para a constituição e formação dos sujeitos.

A questão do pai é igualmente importante para todos nós. Mesmo para aqueles que reúnem a paternidade / filiação registral e afetiva, há sempre algo a indagar sobre o nosso pai / mãe. A paternidade e maternidade são também “lugares” onde depositamos nossas questões mais importantes.

As reflexões aqui trazidas pela autora nos remete a todos a um pensar e repensar de cada um de nós com o seu próprio pai. Mas, para além da reflexões e questionamentos está a sua coragem de trazer esta importante indagação de forma objetiva: afinal porque não podemos ter dois pais em nossa certidão de nascimento? Se os registros públicos e os atos registrais devem traduzir uma realidade, inclusive para emprestar mais segurança às relações jurídica, inserir o nome de dois pais na certidão de nascimento pode estar apenas espelhando a vida como ela é. Para se entender esta nova realidade jurídica devemos nos despir de preconceitos e do velho dogmatismo jurídico. O Direito deve proteger é a essência das relações muito mais do que as formas e formalidades que as envolve. Somente assim a ciência jurídica estará viva e trazendo mais vida à vida.

Rodrigo da Cunha Pereira
* Advogado em Belo Horizonte; Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família/IBDFAM, Doutor (UFPR) e Mestre (UFMG) em Direito Civil; Professor de Direito de Família na PUC/MG; Autor de vários livros.

 

PREFÁCIO

Desde que a família deixou de ser, essencialmente, um núcleo econômico e de reprodução, e passou a ser o espaço do amor, do companheirismo e do afeto, todos os elementos da organização jurídica da família ficaram profundamente alterados. O sustento do laço conjugal deixou de ser a resignação histórica das mulheres, para sustentar-se principalmente no DESEJO. Com isto, o princípio da indissolubilidade do casamento foi vencido pelo princípio basilar do Direito, que é a liberdade dos sujeitos, inclusive, de manterem-se casados e sustentados pelo amor. Assim, a sólida e tradicional tríade, sexo, casamento e reprodução, esteios da família e de sua organização jurídica rompeu-se e deixou de ser o sustentáculo do Direito de Família. Com o aparecimento de um novo discurso sobre a sexualidade, conseqüência da Psicanálise, o casamento deixou de ser a única forma de legitimar as relações sexuais e o sexo fora do casamento deixou de ser ato pecaminoso para tornar-se um ingrediente saudável e vitalizador das relações amorosas. Com a evolução do conhecimento científico a reprodução ficou desatrelada do ato sexual. Com isto, as relações de paternidade, maternidade, filiação deixaram de estar, necessariamente vinculadas aos laços biológicos e a compreensão desta nova realidade fez surgir no ordenamento jurídico brasileiro a expressão parentalidade socioafetiva.

Todas essas mudanças na família, trazidas pelos novos valores, novos paradigmas, têm suas raízes ligadas diretamente às formas e modos de produção econômica. É que a redivisão social do trabalho trouxe um redimensionamento e uma revalorização do trabalho doméstico. Com isto, as mulheres deixaram de ser assujeitadas ao pai ou ao marido, para se tornarem sujeitos da própria vida, já que começaram a participar e interferir nos meios de produção econômica, ainda que fossem mão-de-obra mais barata. De qualquer forma, e por mais que se reconheça seja ainda necessário atribuir um conteúdo econômico para o trabalho doméstico, a mudança estrutural já se operou quando se compreendeu que as mulheres são sujeitos de desejo, assim como os homens, e, portanto sujeitos de direito.

Todas essas modificações interferindo no modus familiae chegaram ao século XXI trazendo para o Direito de Família a incorporação definitiva do afeto como valor jurídico. Em outras palavras, é a sábia frase do jurista mineiro, João Baptista Villela: “o amor está para o Direito de Família, assim como a vontade está para o Direito das Obrigações”.

O afeto como valor jurídico é uma revolução ética paradigmática. Ele nos obriga a pensar que a chamada crise da família talvez seja apenas a dificuldade de se compreender e aceitar o processo de mudanças históricas, mas inevitáveis, e sem volta. Pode-se falar em uma revolução ética porque desestabiliza valores morais e nos faz enxergar uma realidade que muitos ainda preferem não se deparar com ela: famílias desconstruídas, recompostas, monoparentais, binucleares, clonadas ou geradas artificialmente, homoafetivas…

É desta nova realidade do Direito de família que os autores aqui reunidos vieram tratar e retratar. A intenção do coordenador e co-autor, Cristiano Chaves de Farias, ao reunir esses autores, foi trazer, e realmente trouxe, uma contribuição à reflexão e prática desta nova realidade jurídica. Os olhares sobre os diversos temas aqui reunidos traduzem um verdadeiro e novo Direito de Família brasileiro. É um direito que principia e inova, porque faz uma distinção necessária entre ética e moral, e retrata, portanto, um Direito de Família preocupado com a ética do sujeito e com a ética do desejo. Este é o imperativo categórico deste livro que se identifica com a ética e os objetivos do Instituto Brasileiro de Direito de Família.

Rodrigo da Cunha Pereira,
Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Advogado em Belo Horizonte/MG. Professor da PUC/MG. Mestre em Direito Civil e autor de vários livros.

 

PREFÁCIO / APRESENTAÇÃO

Não há honraria maior que se possa prestar a alguém do que publicar um livro em sua homenagem. Antigamente era quase uma coisa de outro mundo. Ainda bem que se passou a fazer esta distinção para o homenageado poder desfrutá-la. Afinal, quem tem uma vida exemplar e pautou sua existência na construção de uma sociedade atenta aos ideais da justiça e da ética precisa saber que seus sonhos se concretizam pelas mãos de quem ouviu suas lições.

Se há pessoa que merece esta homenagem é Paulo Luiz Neto Lôbo. Mais que um professor, é um educador; mais que um autor de livros, é um jurista; mais que um homem, é um pensador; mais que um sujeito-político, é um sujeito ético.

Um punhado de juristas, estudiosos, discípulos e professores se entusiasmaram com a idéia homenageá-lo. Daí esta obra escrita a muitas mãos, mas com um único propósito: construir uma justiça que corresponda aos anseios de uma sociedade em transformação.
Paulo Lôbo plantou muitas sementes. E, uma obra escrita por quem aprendeu a admirá-lo mostra que muitos frutos serão colhidos.

Por onde passa esse alagoano – que se tornou um cidadão do mundo – deixa sua marca de retidão de caráter e o compromisso com uma justiça mais justa e atenta à realidade da vida. Às vezes ele também incomoda. É que não abre mão de suas convicções jurídicas, políticas e filosóficas. Mas, ele não é radical em suas concepções. Ao contrário, pratica sempre a democracia embora saiba defender seus pontos de vista como ninguém.

Suas concepções sobre o Direito estão em seus escritos, que são inúmeros, quase incontáveis, movimentando-se de maneira responsável e consciente em várias áreas do direito. Ninguém como ele discorreu sobre o ensino jurídico e o exercício da advocacia. Mas seus escritos têm uma característica peculiar. Escreve com simplicidade, clareza e profundidade como só o faz quem tem o dom e a responsabilidade de um mestre. São várias as universidades em que já ministrou e ainda ministra aulas e cursos e, por onde passa, vai semeando e incitando a produção de conhecimento. Pode-se dizer, sem medo de exagerar, que o Direito Civil no Brasil contemporâneo passa por Paulo Lôbo. Faz a leitura da lei sob o viés constitucional, o que tem levado à reconstrução da própria Ciência do Direito. É impossível pensar Direito Civil hoje, sem ler os seus escritos. Não é exagero dizer que é um dos maiores civilistas deste país. Sua obra é consistente, profunda, contemporânea, muitas vezes ousada, mas sempre corajosa.

Mas, o melhor de Paulo Lôbo não é o seu vasto e invejável currículo, que vai de professor em várias universidades, acadêmico, jurista, conselheiro representante da classe dos Advogados no Conselho Nacional de Justiça. O melhor de Paulo Lôbo é ser um bom companheiro. Foi um dos fundadores Instituto Brasileiro de Direito de Família. Como seu Diretor da Região Nordeste nunca mediu esforços para que o IBDFAM se tornasse a maior significativa agremiação voltada ao mais humano de todos os direitos. Como integrante da Comissão de Sitematização, foi um dos autores do Estatuto das Famílias, o mais ousado projeto que tramita no Congresso Nacional, e que visa assegurar à sociedade a legislação que merece.

Quem tem o privilégio de conhecer, ouvir, ler os seus trabalhos ou ser aluno de Paulo Lôbo sempre dirá: gracias a la vida pelo privilégio de conviver um pouco e compartilhar com ele ideias e ideais.
Por isso, o melhor de Paulo Lôbo é ele mesmo, é ser ele o sujeito que é.
Um livro publicado em homenagem a alguém é uma honraria para poucos. É para pessoas raras. Paulo Lôbo é assim: uma rara e especial pessoa; um amigo fraterno e um exemplo de vida.
Rodrigo da Cunha Pereira
Advogado em Belo Horizonte –MG, Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Doutor em Direito, Prof. PUC – Minas, autor de vários livros e artigos em Direito de Família e Psicanálise.

Maria Berenice Dias
Advogada, Desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Vice Presidente do IBDFAM, autora de vários livros e artigos em Direito de Família.

 

PREFÁCIO

A família foi, é, e continuará sendo o núcleo básico e essencial de qualquer sociedade. Em sua essência ela continua a mesma: é núcleo estruturante e estruturador do sujeito. Tudo principia e acaba na família. Mas, não nos referimos somente à família hierarquizada, patrimonializada e como núcleo de reprodução. Aí, já não está mais a sua essência. Aliás nunca foram esses elementos que, mesmo contidos na família patriarcal, garantiam a existência do sujeito. Não interessa mais ao Direito o objeto da família, mas o seu sujeito. A grande mudança na organização jurídica da família está, exatamente, na inversão desta equação. Enquanto instituição, como guardiã das tradições, patrimônio, transmissão e circulação de riquezas, ela perdeu a sua força. Ao Direito deve interessar muito mais a essência do que a forma. O sujeito é o que importa e não o seu objeto, ou seja, a forma de constituição da família, pode até variar, de acordo com o tempo e o espaço em que ela se encontra, mas em seu âmago, estará sempre o núcleo estruturante da pessoa e locus para o desenvolvimento da personalidade e o direito a ser humano. Existimos e nos humanizamos é na família, embora estejam aí, as relações mais intrincadas e complexas, segundo Freud. E por isto mesmo mais propícias à eclosão de conflitos.

Com a elevação da pessoa ao centro da cena jurídica tudo teve que ser repensado. Tradicionais institutos jurídicos perderam força e sentido. Houve uma verdadeira “desconstrução” de valores jurídicos, sempre em direção à valorização da pessoa. Com isto compreendeu-se que não é possível pensar em Direito de Família sem pensar em dignidade, inclusão e cidadania. Consequentemente, não foi mais possível falar em ilegitimidade de filhos ou de qualquer tipo de família. Todos os filhos são legítimos e todas as famílias deverão ser reconhecidas pelo Estado. Na era da inclusão e da cidadania, o contrário seria inadmissível, pois seria valorizar o objeto em detrimento dos seus sujeitos.

A compreensão e noção de sujeito permitiu que as mulheres deixassem de ser assujeitadas ao pai ou ao marido para tornarem-se sujeitos da própria vida. Com isto, elas foram deixando para trás a sua resignação, histórica, caindo por terra o princípio da indissolubilidade do casamento. As mulheres, assim como os homens, têm desejos e direitos. Compreendeu-se, definitivamente, que o sujeito de direito é também um sujeito de desejo. Somos todos desejantes de direito, porque somos sujeitos de direito desejantes.

Se “desejo, logo existo”. Se existo e desejo, posso estabelecer e constituir família de diferentes formas. Sexo, casamento e reprodução já não são mais os esteios que sustentam o Direito de Família. Esses elementos desatrelaram-se. O casamento não é mais o que dá legitimidade e legitimação à sexualidade , e como o desenvolvimento da engenharia genética, não é mais necessário sexo para haver reprodução. O esteio e sustentáculo da família é o desejo, que por sua vez se traduz, e se manifesta, muitas vezes, através do afeto. É neste contexto histórico do declínio do patriarcalismo, da igualização de direitos entre homens e mulheres e no reconhecimento da subjetividade que o afeto tornou-se um valor jurídico, elevado à categoria de princípio. Portanto, o princípio jurídico da afetividade é o grande norteador de todo o Direito de Família Contemporâneo, ao lado, obviamente, do macro princípio da dignidade da pessoa humana. Os autores conseguiram fazer um livro que reuniu, com sabedoria, todos esses novos elementos e paradigmas.

Direito das Famílias é um livro da contemporaneidade. Inova, renova mas também mantém a consistência dos clássicos e tradicionais livros que percorrem todo o “programa oficial” do Direito de Família. É um livro que consegue trazer todos os novos elementos e paradigmas para uma melhor organização jurídica das famílias. Cristiano Chaves e Nelson Resenvald, baiano e carioca-mineiro, nos levam a percorrer, e a entender com facilidade e prazer, temas difíceis e complexos. Eles conseguiram manter, simplicidade sem perder profundidade. É um livro mais que importante. Essencial
Rodrigo da Cunha Pereira

Doutor em Direito Civil pela Universidade Federal do Paraná/UFPR e Mestre em Direito Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais/UFMG; Professor de Direito de Família da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais/PUC – MG; Autor de vários livros e trabalhos em Direito de Família e Psicanálise; Advogado em Belo Horizonte/MG –, onde trabalha interdisciplinarmente com Direito e Psicanálise; Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família/IBDFAM

 

 

 

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