O que faz a guarda compartilhada ainda ser um tabu no Judiciário brasileiro
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Em 2011, quando se separou da mulher, o publicitário João Ricardo Costa imaginou dias conturbados nas relações com a ex. Mas não a saga de visita a advogados e mesmo campanhas em Brasília a que se submete há quase quatro anos para tentar ter mais acesso à filha, Isabelli.
Costa tem permissão para ficar com a menina apenas 60 dias por ano, e para lidar com o impacto emocional da ausência, criou um desenho animado em que uma menina com o mesmo nome da filha imagina soluções para ver o pai. A animação foi custeada por meio de uma campanha de financiamento coletivo e o publicitário a inscreveu em uma série de festivais educativos.
No final de 2014, Costa viu na Lei 13.058 uma oportunidade de ouro para mudar a situação criada pelo divórcio. Sancionada pela então presidente Dilma Rousseff, a lei tornou a guarda compartilhada de filhos regra, mesmo sem acordo entre os pais – uma alteração crucial na legislação anterior, de 2008.
“Minha filha é órfã de um pai vivo. Essa lei veio equalizar interesses, para o bem das crianças. Mas até hoje estou esperando um julgamento do meu pedido. Pelo menos com o desenho um dia vou poder mostrar para a minha filha como eu fiz o que podia para tentar participar da vida dela”, explica ele.
O problema é que, apesar desse avanço no tratamento da custódia de crianças em separações, a Justiça brasileira tem mostrado relutância em aplicá-lo a decisões.
De acordo com as mais recentes estatísticas do IBGE, com dados de 2013 e 2014, a guarda de filhos de pais divorciados continua sendo da mãe em 85,1% dos casos levados ao Judiciário. Ao mesmo tempo em que, entre 1984 e 2014, o percentual de guarda paterna caiu de 12,3% para 5,5%.
Tudo isso em um cenário de aumento de divórcios: nos últimos 30 anos até 2014, os casos no Brasil cresceram de cerca de 32 mil para 267 mil por ano. Segundo o sociólogo Fernando Valentim, criador do site Observatório da Guarda Compartilhada, que compila estatísticas oficiais sobre o tema, litígios de divórcio no Brasil envolveram mais de 1,6 milhão de crianças entre 2003 e 2013.
“É para isso que queremos chamar a atenção. A guarda compartilhada não é uma questão de gênero, mas sim um direito da criança. Mas quando paramos para pensar que o Estatuto da Criança e do Adolescente só foi criado em 1990 (13 anos depois da Lei do Divórcio), percebemos que filhos ainda são vistos como uma espécie de bem na hora da separação”, afirma Valentim.