Em Goiás, uma idosa que participou da criação da neta do marido após a morte da mãe biológica foi reconhecida como mãe socioafetiva da criança. Com a decisão da Quarta Vara de Família de Goiás, a menina passa a ter o sobrenome de duas mães no registro de nascimento e de quatro avós maternos.
No caso dos autos, a mãe biológica da criança morreu em 2018. Em razão da paternidade desconhecida, a tutela foi concedida ao avô materno, que passou a criar a menina ao lado da esposa, com quem é casado há dezoito anos.
Ao solicitar o reconhecimento da maternidade socioafetiva, os autores defenderam o surgimento de vínculo socioafetivo entre a mulher e a criança. O caso contou com a atuação da advogada Silvia Cunha, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
O vínculo materno-filial foi comprovado por laudos da equipe multidisciplinar. Ao avaliar o caso, o juiz reconheceu o carinho e afeto demonstrados durante o processo de jurisdição voluntária.
Fonte: Assessoria de comunicação do IBDFAM
Valor jurídico do afeto
Para o advogado Rodrigo da Cunha Pereira, especialista em Direito de Família e Sucessões, essa decisão revela a importância do afeto como valor jurídico. “A afetividade pode se traduzir como fonte de obrigação jurídica porque significa atenção, imposição de limites, convivência e todos os cuidados necessários para o desenvolvimento saudável de uma criança ou adolescente”, avalia.
O advogado explica ainda que a socioafetividade pode ser fonte geradora do parentesco, seja em razão do exercício da paternidade, maternidade, irmandade ou outro vínculo parental, que se consolida ao longo do tempo. Daí, pode-se falar de parentalidade socioafetiva. “A concepção da socioafetividade começa com a paternidade, mas obviamente se estende à maternidade e a todos os vínculos de parentesco. Daí termos ampliado a sua ideia para parentalidade socioafetiva”, ressalta.
A parentalidade socioafetiva revolucionou o nosso sistema jurídico
Para o advogado, a compreensão da parentalidade socioafetiva tal como a concebemos hoje, revolucionou o nosso sistema jurídico.
“Primeiro porque ela pode mudar os rumos de uma investigação de paternidade, já que o investigado pode ser o genitor, mas não necessariamente será o pai; segundo porque a declaração judicial de uma parentalidade socioafetiva pode alterar completamente a partilha de bens post mortem, pois declara-se a existência de mais um filho e consequentemente mais um herdeiro; e terceiro, porque na evolução do conceito da paternidade/maternidade socioafetiva, vem a possibilidade de que uma pessoa pode ter mais de um pai ou uma mãe”, explica.
“Em outras palavras, a paternidade/maternidade socioafetiva não necessariamente exclui o(a) genitor(a), o que temos chamado de multiparentalidade ou pluriparentalidade, que também já é uma realidade nos tribunais brasileiros”, completa.