Pressione "ENTER" para buscar ou ESC para sair

TJSP: Alimentos

Ronner Botelho

(…) RODRIGO DA CUNHA PEREIRA lembra que “o casamento não pode ser visto como uma ‘previdência social’, nem um estímulo ao ócio. Nas palavras de Paulo Lobo: ‘O direito aos alimentos não tutela os que voluntariamente optaram pela ociosidade’. Os alimentos ficaram restritos aos casos específicos de real necessidade, e esta obrigação é recíproca entre os cônjuges. A presunção somente se aplica em favor dos filhos menores e incapazes.”

APELAÇÃO – UNIÃO ESTÁVEL – ALIMENTOS EM FAVOR DA EX -COMPANHEIRA – Ausência de situação excepcional que justifique a fixação de pensão alimentícia – Isonomia entre companheiros – Autora com 42 anos, capaz e que viveu em união estável por menos de cinco anos – Contraindicação médica apenas para o desempenho de atividades específicas – Diagnóstico de epilepsia antes do início do relacionamento que não a impossibilitou de trabalhar – Incapacidade laborativa não comprovada – Pagamento de alimentos provisórios por mais de um ano – Tempo suficiente para restruturação econômica – Necessidade não comprovada – Inexistência da obrigação alimentar – DEVOLUÇÃO DOS BENS PESSOAIS – O suposto fato de o companheiro ter obrigado a companheira a se desfazer de seus móveis quando foram morar juntos não é motivo suficiente a autorizar a retenção de bens que não são de sua propriedade – Mantida a sentença que julgou improcedente o pedido de alimentos e determinou à ex-companheira a devolução dos pertences do ex-companheiro – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

(TJ-SP – AC: 10004301420198260019 SP 1000430-14.2019.8.26.0019, Relator: Alexandre Coelho, Data de Julgamento: 29/10/2020, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/10/2020)

Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2020.0000888296

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000430-14.2019.8.26.0019, da Comarca de Americana, em que é apelante F. C. C. DE A. (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA), é apelado S. L. P..

ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores THEODURETO CAMARGO (Presidente sem voto), CLARA MARIA ARAÚJO XAVIER E SALLES ROSSI.

São Paulo, 29 de outubro de 2020.

ALEXANDRE COELHO

Relator

Assinatura Eletrônica

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Apelação nº 1000430-14.2019.8.26.0019

Apelante: F. C. C. A.

Apelado: S. L. P.

VOTO nº 16193/lmi

APELAÇÃO UNIÃO ESTÁVEL – ALIMENTOS EM FAVOR DA EX-COMPANHEIRA Ausência de situação excepcional que justifique a fixação de pensão alimentícia Isonomia entre companheiros Autora com 42 anos, capaz e que viveu em união estável por menos de cinco anos Contraindicação médica apenas para o desempenho de atividades específicas Diagnóstico de epilepsia antes do início do relacionamento que não a impossibilitou de trabalhar – Incapacidade laborativa não comprovada

Pagamento de alimentos provisórios por mais de um ano Tempo suficiente para restruturação econômica

Necessidade não comprovada Inexistência da obrigação alimentar DEVOLUÇÃO DOS BENS PESSOAIS O suposto fato de o companheiro ter obrigado a companheira a se desfazer de seus móveis quando foram morar juntos não é motivo suficiente a autorizar a retenção de bens que não são de sua propriedade Mantida a sentença que julgou improcedente o pedido de alimentos e determinou à excompanheira a devolução dos pertences do ex-companheiro

NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Trata-se de apelação interposta pela autora contra a respeitável

sentença, cujo relatório ora se adota, que julgou procedente em parte a ação declaratória,

para os fins de reconhecer a união estável entre as partes, no período de 24/09/2014 a

08/01/2019 e de determinar à autora a devolução dos pertences do réu, julgando

improcedente o pedido de alimentos em favor da ex-companheira.

A apelante pugna pela reforma da r. sentença a fim de que seja

julgado procedente o pedido de alimentos e para que ela seja mantida na posse dos bens

móveis que guarnecem a sua residência. Sustenta que: i) vem conseguindo pagar suas

despesas através dos alimentos provisórios fixados em 1/3 do salário mínimo; ii) está em

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

ao mercado de trabalho nesse momento; iii) a pretensão de retirar os bens móveis em posse da apelante tem cunho de provocar mais uma dificuldade financeira e psicológica, além de, no início da união estável, o apelado ter a obrigado a se desfazer dos móveis que possuía, ao argumento de serem eles velhos.

O apelado apresentou contrarrazões.

Não houve oposição ao julgamento virtual.

É o relatório do essencial.

Atendidos os requisitos de admissibilidade, o recurso é recebido no duplo efeito, nos termos do artigo 1.012, caput, do C.P.C., e conhecido.

A r. sentença reconheceu a existência de união estável entre as partes no período de 24/09/2014 a 08/01/2019, determinou à autora a devolução dos pertences do réu, desde que haja a comprovação da nota fiscal da propriedade, bem como julgou improcedente o pedido de alimentos em favor da ex-companheira.

Insurge a autora, requerendo a fixação dos alimentos, assim como a improcedência do pedido do ex-companheiro de restituição de bens móveis e objetos pessoais que encontram na posse da ex-companheira.

Pois bem.

A concessão de alimentos em favor de ex-cônjuge, em razão de seu caráter excepcional, demanda a efetiva comprovação da alegada necessidade.

É entendimento dominante que, com a isonomia conjugal, em que marido e mulher têm os mesmos direitos e obrigações, e em razão da abertura do mercado para as mulheres, a nova realidade socioeconômica dos cônjuges os coloca em pé de igualdade com relação ao trabalho e ao sustento da família, ao contrário de algumas décadas atrás, em que normalmente apenas o homem trabalhava, enquanto a mulher cuidava dos filhos e dos afazeres domésticos.

Com a chegada desta nova realidade aos tribunais, as decisões passaram a ser no sentido de que, com o divórcio ou dissolução da união estável, não deve haver obrigação alimentar entre ex-cônjuges, ao menos em regra.

RODRIGO DA CUNHA PEREIRA lembra que “o casamento

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

não pode ser visto como uma ‘previdência social’, nem um estímulo ao ócio. Nas palavras de Paulo Lobo: ‘O direito aos alimentos não tutela os que voluntariamente optaram pela ociosidade’. Os alimentos ficaram restritos aos casos específicos de real necessidade, e esta obrigação é recíproca entre os cônjuges. A presunção somente se aplica em favor dos filhos menores e incapazes.” 1

No caso concreto, a autora possui 42 anos , viveu em união estável por curto período (menos de cinco anos) e, ainda que alegue problemas de saúde, é de se ver que não está incapacitada para toda e qualquer atividade laborativ a, mas apenas possui “CONTRADIÇÃO NEUROLÓGICA PARA EXERCÍCIO DE SITUAÇÃO DE RISCO/ DIREÇÃO DE VEÍCULOS/ALTURA MAQUINARIA DE RISCO E AFINS”, conforme comprova o atestado médico por ela trazido a fls. 24.

Aliás, este mesmo relatório médico indica que a autora já possuía o diagnóstico de epilepsia muito antes do início da união estável (fls. 24), condição esta que não lhe impossibilitou de trabalhar , consoante se denota das anotações de sua carteira de trabalho (fls. 11/16).

Deste modo, uma vez que a apelante é pessoa jovem, capaz e apta ao trabalho, em condições de prover o próprio sustento, não demonstrada está a necessidade à percepção de alimentos do ex-companheiro. Ademais, é de se ver que o réu pagou alimentos provisórios à autora por mais de um ano, tempo este suficiente para que ela pudesse se reestruturar economicamente.

Assim, não comprovada a necessidade à percepção dos alimentos, mantem-se a solução adotada na origem.

Igualmente ocorre quanto à obrigação reconhecida pela r. sentença da ex-companheira de restituir os bens pessoais do ex-companheiro, uma vez que que ela sequer nega estar na posse deles . O fato de o ex-companheiro ter supostamente a obrigado a se desfazer de seus móveis quando foram morar juntos não é motivo suficiente a autorizar a retenção de bens que não são de sua propriedade.

Daí porque nenhum reparo comporta a r. sentença.

Em razão da sucumbência em grau recursal, deverá a autora arcar com o pagamento de honorários recursais de R$600,00, com correção

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

monetária desde a publicação do acórdão e juros de mora a contar de seu trânsito em julgado, observada a gratuidade de justiça concedida.

Por fim, com o intuito de se evitar a necessidade de oposição de embargos declaratórios para o específico fim de prequestionamento, como forma de se viabilizar a interposição de recursos nas instâncias superiores, fica, desde logo, prequestionada toda a matéria apontada, seja ela constitucional ou infraconstitucional e até mesmo infralegal, na medida em que houve a análise e consequente decisão em relação a todas as questões controvertidas, ressaltando que há muito já se pacificou o entendimento de que não está o colegiado obrigado a apreciar individualmente cada um dos dispositivos legais suscitados pelas partes, competindo a estas, no mais, observar o disposto no artigo 1026, § 2º do CPC.

Caso ainda assim sejam opostos embargos de declaração contra o acórdão, estes serão julgados virtualmente, a bem da eficiência, salvo se a parte embargante manifestar expressa oposição na própria petição de interposição.

Ante o exposto, pelo presente voto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso.

ALEXANDRE COELHO

Relator

(assinatura eletrônica)

Open chat
Posso ajudar?