Decisões impedem que filhos maiores vivam indefinidamente de pensão
Fonte: STJ
O que antes era um dever, passa a ser exercício de solidariedade. A obrigação alimentar devida aos filhos “transmuda-se do dever de sustento inerente ao poder familiar, com previsão legal no artigo 1.566, inciso IV, do Código Civil (CC), para o dever de solidariedade resultante da relação de parentesco, que tem como causa jurídica o vínculo ascendente-descendente e previsão expressa no artigo 1.696 do CC”, ensina o ministro Marco Aurélio Bellizze.
De acordo com jurisprudência pacificada no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o advento da maioridade não extingue automaticamente o direito ao recebimento de pensão alimentícia. Sobre esse tema, a Súmula 358 do STJ dispõe que “o cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos”.
Isso porque, conforme explica o ministro João Otávio de Noronha, cessando a obrigação alimentar compulsória, permanece o dever se assistência fundado no parentesco consanguíneo.
Contudo, nessa hipótese, é do alimentado, ou seja, do filho maior, o ônus de comprovar que permanece com a necessidade de receber alimentos ou, ainda, que frequenta curso universitário ou técnico, “por força do entendimento de que a obrigação parental de cuidar dos filhos inclui a outorga de adequada formação profissional”, conforme aponta Bellizze.
Leia abaixo parte do verbete Alimentos, do Dicionário de Direito de Família e Sucessões Ilustrado do advogado Rodrigo da Cunha Pereira.
ALIMENTOS [ver tb. abandono material, alimentos civis, alimentos compensatórios, alimentos gravídicos, alimentos naturais, alimentos provisórios, alimentos provisionais, alimentos transitórios, indexador, alimentar] – Alimentos é uma expressão técnico-jurídica para designar uma verba destinada àquele que não pode prover por si mesmo sua subsistência. É também conhecida como pensão alimentícia. Os sujeitos da relação pensionária são o alimentante e o alimentário. Os alimentos, ou pensão alimentícia, podem ser pagos em espécie, ou in natura, ou de forma mista, isto é, uma parte em dinheiro e outra diretamente aos credores, ou mesmo com a entrega direta dos bens de consumo.
Os alimentos decorrem da solidariedade que deve existir nos vínculos parentais e conjugais, visando garantir a subsistência do alimentário, de acordo com sua necessidade e a possibilidade do alimentante.
As fontes da obrigação alimentar são o parentesco, casamento e união estável. Todavia, pode decorrer de ato ilícito, testamento e contrato. O quantum alimentar deve ser estabelecido em atendimento ao binômio necessidade/possibilidade, compatibilizando com o padrão de vida e a condição social das partes envolvidas (Art. 1.694, CCB).
As expressões “obrigação alimentar” e “dever de sustento” são constantemente confundidas, o que torna necessário fazer tal distinção. Nem tanto pelo seu conceito, pois são muito próximos, mas muito mais pelos fatos e consequências em um processo judicial, pois tal distinção acarretara a maior ou a menor necessidade de dilação probatória. O dever ou a obrigação de sustento advém do poder familiar (Arts. 1.566, IV, CCB, e 22, ECA). E a forma que o filho menor tem de ter suprido seu sustento até que este complete a maioridade ou que seja emancipado. Neste caso, a necessidade do alimentário é presumida, devendo o valor final dos alimentos ser adequado a possibilidade do pai ou da mãe obrigados. O seu descumprimento pode acarretar, inclusive, a destituição do poder familiar e a caracterização de crime de abandono (Art. 244, CP). Contudo, a destituição do poder familiar não exime o genitor do dever de sustento, o que se transformaria em prêmio aos pais alimentantes. Com a maioridade, e, portanto, extinto o poder familiar, consequentemente, extinto também o dever de sustento, persiste, entretanto, a obrigação alimentar.
Ela decorre dos vínculos de parentesco, independentemente do poder familiar, qual seja, dos filhos maiores, entre descendentes e ascendentes, irmãos, cônjuges e companheiros. Diferentemente do sustento entres pais e filhos menores, esta obrigação não é presumida e depende de prova no binômio necessidade versus possibilidade.
A pensão alimentícia decorrente do casamento e da união estável, atrela-se também ao binômio necessidade e possibilidade, mas também a duração da conjugalidade. Certamente, os critérios do quantum decorrente de um casamento de curta duração são muito diferentes de uma conjugalidade de longa duração. Deve ter sempre um indexador econômico para evitar que o valor não fique defasado ao longo do tempo, a não ser que a pensão incida sobre percentual da remuneração do alimentante, quando for caso de relação empregatícia.
O mais comum dos indexadores é o salário mínimo. Embora haja proibição constitucional de se indexar o salário mínimo, o próprio Supremo Tribunal Federal já havia autorizado tal indexação.
A Emenda Constitucional no 64/10 alterou o art. 6º da Constituição da República para introduzir a alimentação como um direito social, o que reforça a sua amplitude e importância como direito essencial e atributo da dignidade da pessoa humana. São vários os princípios e características consagrados em nosso Direito que funcionam como vetores exegéticos dos alimentos, e que se presentificam, ora em uma, ora em outra forma alimentar, ou seja, nos alimentos decorrentes do parentesco ou do vínculo conjugal. Personalíssimo: sua titularidade não pode ser transferida a outrem, pois é destinado a preservar a sobrevivência de quem os recebe, assegurando a existência e a integridade física e psíquica do individuo que não pode manter-se sozinho; Irrenunciabilidade: o Código Civil de 2002 ratificou a impossibilidade de renuncia de alimentos, retomando-se a discussão sobre a matéria em relação aos cônjuges. Apesar de o Código Civil de 1916 vedar a renúncia aos alimentos, o entendimento da jurisprudência na vigência daquele Código, acertadamente, era de que esse dispositivo não tinha validade quanto aos cônjuges.
E, embora no CCB/02 tenha repetido a fórmula equivocada da proibição da renúncia alimentar, a tendência jurisprudencial é a mesma do Código de 1916. Portanto, não é possível a renúncia entre pais e filhos menores, mas o é entre cônjuges e companheiros; Intransmissibilidade: o CCB 1916 (Art. 402), dispunha que o encargo alimentar era intransmissível. O art. 23 da Lei no 6.515/77 estabelecia que a obrigação alimentar entre cônjuges se transmitia aos herdeiros do devedor. O CCB/02 (Art. 1.700) estabeleceu que a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor (Art. 1.694). Assim, preservado está o caráter personalíssimo do instituto, vez que este dispositivo determina que apenas o dever de cumprir a obrigação de prestar alimentos se transmite aos herdeiros do devedor, não sendo transferido o direito a alimentos e a obrigação em si, que é pessoal. Portanto, ocorre uma sub-rogação limitada – sempre de acordo com as forças da herança– do dever de cumprir a prestação alimentícia; Indisponibilidade: incedibilidade, impenhorabilidade e incompensabilidade: em decorrência do caráter personalíssimo dos alimentos, eles não podem ser cedidos, penhorados ou compensados (Arts. 1.707 e 373, II, CCB). A vedação da cessão de alimentos a titulo oneroso ou gratuito justifica- se em razão das peculiaridades de cada caso concreto presentes na fixação do valor da pensão alimentícia. A vedação da impenhorabilidade justifica-se porque os alimentos são para garantir a subsistência do alimentário, razão pela qual inadmissível que credores privem o necessitado do valor que assegura sua própria sobrevivência. Admite-se exceções, quais sejam, a penhora dos bens adquiridos com o valor da pensão alimentícia e a penhora de parte deles, desde que preservados os alimentos naturais, tendo em vista que estaria inserido no valor total da pensão alimentícia uma parcela que não é destinada a sobrevivência. A proibição da compensação dos alimentos justifica- se pelos mesmos motivos da impenhorabilidade, ou seja, porque os alimentos são pagos para a preservação do sustento e preservação da vida do alimentário. Portanto, não pode haver a compensação do credito alimentar, em razão de dividas como acontece, tratando-se de divida comum; Irrepetibilidade: significa que não há devolução de valores pagos a título de alimentos, ou seja, se constatado, posteriormente, em ação revisional ou exoneratória de alimentos, por exemplo, que o pagamento da pensão alimentícia não era devido, não há que se falar em restituição. A irrepetibilidade dos alimentos pode ser excepcionada, inclusive sob a argumentação de se evitar enriquecimento ilícito.
DISPOSITIVOS NORMATIVOS
CR – Art. 229.
CCB – Art. 1.566, IV, 1.694 a 1.710.
CP – Art. 244.
Lei no 5.478/68 – Dispoe sobre acao de alimentos e da outras providencias.
Lei no 8.069/90 – Estatuto da Crianca e do Adolescente.
Lei no 10.741/03 – Estatuto do Idoso.
Sumulas do STJ: 1, 277, 336 e 358.