TJPR: União estável
(…) Nesse diapasão, Rodrigo da Cunha Pereira : Assim, para entender união estável é fundamental compreender, antes, o que é família. É que o interesse do Estado é dar proteção às entidades familiares. O delineamento do conceito de união estável deve ser feito buscando os elementos caracterizadores de um ‘núcleo familiar’. É preciso saber se daquela relação nasceu uma entidade familiar. (…) É o conjunto de determinados elementos que ajuda a objetivar e a formatar o conceito de família. O essencial é que se tenha formado com aquela relação afetiva e amorosa uma família, repita-se. Os elementos intrínsecos e extrínsecos, objetivos e subjetivos, em cada caso concreto, são os que nos ajudarão a responder se ali está caracterizada, ou não, uma união estável. (In. Direito de Família e o Novo Código Civil, Belo Horizonte, 2005. Del Rey; 4 ed. rev. e atual. p.221).
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA PARAÍBA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
QUARTA CÂMARA CÍVEL
ACÓRDÃO
Apelação Cível nº 0058209-72.2006.815.2001
Origem : 6ª Vara de Família da Comarca da Capital
Relator : Desembargador Frederico Martinho da Nóbrega Coutinho
Apelante : Zuleide Maria de Oliveira
Advogados : José Olavo C. Rodrigues e outro
Apelada : Maria José Meireles da Fonseca
Advogados : José Hervasio Gabínio de Carvalho e outro
Apelada : Maria Jucely de Farias
Advogado : Tiago Sobral Pereria Filho e outro
APELAÇÃO . RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
IMPROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO.
RELACIONAMENTOS SIMULTÂNEOS.
IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. INEXISTÊNCIA DO OBJETIVO DE CONSTITUIÇÃO DE FAMÍLIA. SENTENÇA MANTIDA. DESPROVIMENTO.
– Mantém-se a sentença que julga improcedente o pedido inicial contido em ação de reconhecimento de união estável se, pelos elementos carreados a processado, não se pode aferir o preenchimento dos requisitos necessários à configuração daquele instituto, à luz do disposto no art. 1.723 e seguintes,
do Código Civil.
VISTOS , relatados e discutidos os presentes autos.
ACORDA a Quarta Câmara Cível do Tribunal
de Justiça da Paraíba, por unanimidade, desprover o recurso.
Trata-se de APELAÇÃO , fls. 161/164, interposta por Zuleide Maria de Oliveira contra sentença de fls. 155/157, prolatada pelo Juiz de Direito da 6ª Vara de Família da Comarca da Capital, a qual, em Ação de Reconhecimento de União Estável c/c Partilha de Bens ajuizada em desfavor do Espólio de José Agostinho Meireles , representado por Maria Jucely de Farias , julgou improcedente o pedido, em decisão assim ementada:
EMENTA: Direito de Família – União estável – Inexistência de convivência more uxorio erguida em forma de uma “entidade familiar” que caracteriza a “união estável” – Relacionamento não marcado pela periodicidade, constância e notoriedade da convivência, com objetivo de constituição de família – Desacolhimento do pedido.
Em suas razões, a autora pretende a reforma da decisão, discorrendo acerca do instituto da união estável, buscando demonstrar sua condição de concubina do de cujus. No mais, mostra os bens a serem partilhados e se limita ao requerimento dos benefícios da justiça gratuita, tudo nos termos já expostos em sua peça inaugural.
Contrarrazões pela parte apelada, apenas pedindo a manutenção do decisum atacado, porquanto o pedido inaugural era impossível de ser alcançado por meio da ação ajuizada, fls. 51/52.
A Procuradoria de Justiça , através da Dra. Jacilene
Nicolau Faustino Gomes , opinou pelo desprovimento do recurso, fls. 59/63.
É o RELATÓRIO .
VOTO
Zuleide Maria de Oliveira ajuizou Ação de Reconhecimento de União Estável c/c Partilha de Bens , em desfavor do Espólio de José Agostinho Meireles , representado por Maria Jucely de Farias , buscando demonstrar sua condição de concubina do de cujus, assim como partilhar os bens decorrentes da união.
Julgando o feito, o Magistrado a quo indeferiu o pedido, pelas seguintes razões, fl. 156:
…daí que, data vênia, desse ônus não se desincumbiu a parte autora, deixando de apresentar conjunto probatório hábil a confirmar as suas alegações, de fato e de direito, constantes na petição inicial.
(…)
o contrário, transparece-se mais que entre os supostos conviventes houve sim, um relacionamento amoroso, sem, contudo, ter “objetivo de constituição de família”, para poder ser erigido ao nível de “união estável”, conclusão alicerçada, inclusive, no fato do falecido manter paralelamente um caso amoroso com a promovida Maria Juceli de Farias.
(…)
Frente ao exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE UNÃO ESTÁVEL.
Em conseqüência, extingo o processo, com resolução
do mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC.
A inconformada postula a reforma da sentença, ao tempo em que rememora os termos da petição inicial, alegando a convivência entre ela e o falecido, hábil a dar margem ao reconhecimento da união estável.
Sem razão, contudo.
Como é cediço, a Constituição Federal, no art. 226, § 3º, tutela a união estável – equivalente ao concubinato puro – como sendo a relação do homem com a mulher, onde não haja impedimento matrimonial, suscetível de estabilidade e com possibilidade legal de ser convertida em casamento.
Confira-se, pois, o texto constitucional:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
o regular o dispositivo constitucional, o Código Civil estabelece em seu art. 1.723:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de família.
Mais adiante, o mesmo Código preceitua em seu art. 1.724:
Art. 1.724. As relações pessoais entre os
companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
De uma interpretação literal dos dispositivos acima transcritos, verifica-se que o reconhecimento de uma união estável está, invariavelmente, condicionado à materialização do intuito das partes em constituir uma família, alvo da proteção por parte do Estado.
Para tanto, tenho por necessária uma breve conceituação do termo família.
Segundo o Dicionário Aurélio , dentre as várias concepções do instituto ali previstas, destaco duas que se amoldam ao presente caso:
1) Pessoas aparentadas, que vivem, em geral, na
mesma casa, particularmente, o pai, a mãe e os filhos. 2) Pessoas unidas por laços de parentesco, pelo
sangue ou por aliança. (In. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Rio de Janeiro, 1999. Nova Fronteira, 3 ed, revista e ampliada.).
Ultrapassada a mera conceituação gramatical, resta um conceito jurídico para o termo família, indispensável para a configuração do instituto da união estável.
Nesse diapasão, Rodrigo da Cunha Pereira :
Assim, para entender união estável é fundamental compreender, antes, o que é família. É que o interesse do Estado é dar proteção às entidades familiares.
O delineamento do conceito de união estável deve ser feito buscando os elementos caracterizadores de
um ‘núcleo familiar’. É preciso saber se daquela relação nasceu uma entidade familiar. (…) É o conjunto de determinados elementos que ajuda a objetivar e a formatar o conceito de família. O essencial é que se tenha formado com aquela relação afetiva e amorosa uma família, repita-se. Os elementos intrínsecos e extrínsecos, objetivos e subjetivos, em cada caso concreto, são os que nos ajudarão a responder se ali está caracterizada, ou não, uma união estável. (In. Direito de Família e o Novo Código Civil, Belo Horizonte, 2005. Del Rey; 4 ed. rev. e atual. p.221).
Volvendo à realidade dos autos, tenho que razão não assiste à apelante, merecendo, por isso, ser mantida, in totum, a sentença, pelos motivos que passaremos a expor. Embora não se desconheça a relação havida entre a inconformada e o de cujus, tal situação somada aos demais elementos trazidos não são suficientes para se afirmar que dito relacionamento teve por objetivo a constituição de família e, principalmente, que esta relação foi norteada pelos deveres de lealdade, respeito e assistência, como determinado pela legislação vigente.
Prova do que fora aqui enunciado é o fato de duas mulheres, a promovente, Zuleide Maria de Oliveira e Maria Jucely de Farias, em autos tombados sob o nº 200.2006.001146-3, afirmarem convivência entre elas e José Agostinho de Meireles, falecido em 03 de outubro de 2004, caracterizando a multiplicidade de relacionamento e, por via de consequência, desconfigurando, por completo, a instituição da união estável.
Soma-se a isto o teor dos depoimentos colhidos, durante a instrução do feito, os quais não permitem a conclusão no sentido de que o falecido mantinha com a autora um relacionamento exclusivo, nos moldes exigidos pela legislação para que se configurasse uma legítima união estável, de maneira a autorizar a procedência do pedido inicial formulado pela autora. Não se prestando para tanto, o contrato de locação e as fotografias, fls. 61/69.
Assim sendo, a sentença recorrida deve ser mantida em toda sua plenitude.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO A RECURSO .
É o VOTO.
Participaram do julgamento, os Desembargadores Romero Marcelo da Fonseca Oliveira (Presidente), Frederico Martinho da Nóbrega Coutinho (Relator) e João Alves da Silva.
Presente o Dr. Amadeus Lopes Ferreira, representando o Ministério Público.
Sala das Sessões da Quarta Câmara Cível do Tribunal
de Justiça da Paraíba, em 12 de abril de 2016 – data do julgamento.
Frederico Martinho da Nóbrega Coutinho
Desembargador
Relator
Apelação Cív