TJRS reconhece multiparentalidade
Os desembargadores da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) decidiram pela multiparentalidade na certidão de nascimento de adotanda. Assim, constará no registro da jovem o nome do pai biológico e do pai-adotante e, como consequência, a adoção do sobrenome do adotante sem prejuízo da manutenção do sobrenome do pai biológico.
No caso, durante processo de adoção de enteada por padastro o juíz julgou parcialmente procedente a ação determinando a adoção. No entanto, o sobrenome do pai biológico da moça deveria ser retirado de sua certidão de nascimento. Suprimindo assim o vínculo da jovem com o seu pai biológico.
Padastro e enteada entraram com recurso contra a sentença. A jovem afirmou que não tem interesse em suprimir a paternidade biológica contida em seu registro de nascimento e, principalmente, do seu nome. Ela sustentou que, apesar de seu pai biológico ter falecido quando tinha apenas dois anos, quer manter a lembrança dele. Desse modo, ambos recorreram ao TJRS pedindo o reconhecimento da multiparentalidade.
Para o desembargador Alzir Felippe Schmitz, relator, o falecimento do pai biológico e o exercício da paternidade pelo padastro, são fatores que não afastam a memória do pai biológico e não rompem os demais vínculos da jovem com a família de seu genitor. Para ele, ficou compravado que padastro e enteada têm relação de filha e pai consolidada pelos anos de convivência como se filha e pai fossem, atribuindo à relação tal status não só na intimidade como perante a comunidade em que estão inseridos. “Portanto, observada a hipótese da existência de dois vínculos paternos em relação à Juliana, caracterizada está a possibilidade de reconhecimento da multiparentalidade”, disse.
O verbete “Multiparentalidade”, retirado do Dicionário de Direito de Família e Sucessões, do advogado Rodrigo da Cunha Pereira, ilustra a decisão. Saiba mais.
MULTIPARENTALIDADE [ver tb. família,multiparental, parentalidade, socioafetividade] – É o parentesco constituído por múltiplos pais, isto é, quando um filho estabelece uma relação de paternidade/maternidade com mais de um pai e/ou mais de uma mãe. Os casos mais comuns são os padrastos e madrastas que também se tornam pais/mães pelo exercício das funções paternas e maternas, ou em substituição a eles. A multiparentalidade é comum, também, nas reproduções medicamente assistidas, que contam com a participação de mais de duas pessoas no processo reprodutivo, como por exemplo, quando o material genético de um homem e de uma mulher é gestado no útero de uma outra mulher.
A multiparentalidade, ou seja, a dupla maternidade/paternidade tornou-se uma realidade jurídica, impulsionada pela dinâmica da vida e pela compreensão de que paternidade e maternidade são funções exercidas. É a força dos fatos e dos costumes como uma das mais importantes fontes do Direito, que autoriza esta nova categoria jurídica. Daí o desenvolvimento da teoria da paternidade socioafetiva que, se não coincide com a paternidade biológica e registral, pode se somar a ela.
O conceito de multiparentalidade revolucionou o sistema jurídico de paternidade e maternidade concebido até então. O registro civil, que tem função de registrar a realidade civil das pessoas, tem-se adaptado a esta realidade. Foi neste intuito que a Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73) foi alterada em 2009, pela Lei nº 11.924, para tornar possível acrescentar o sobrenome do padrasto/madrasta no assento do nascimento da pessoa natural: O enteado ou a enteada, havendo motivo ponderável (…), poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus apelidos de família (Art. 57,§ 8º). É também conhecida como pluriparentalidade.